domingo, 22 de dezembro de 2024

SOBRE O ACONTECIMENTO

Contra uma pressuposição substancialista que pensa em termos de sujeitos e predicados, substâncias e atributos, Deleuze, em “Lógica do sentido”, traz o conceito de acontecimento e uma teoria da individuação a partir deste conceito. Um exemplo simplificado pode ser instrutivo neste aspecto. Imaginemos um animal tal como um javali. A posição que Deleuze quer contrastar seria aquela que pensa o “javali” em termos de sujeito e predicados; o javali como dotado de um substrato no qual se escrevem predicados/atributos tais como “ser mamífero”, “dentes grandes” etc. Para Deleuze, o javali é a condensação de uma série de acontecimentos e a sua existência é esta condensação em ato, sem nada para além, substância ou substrato. Estes acontecimentos seriam processos que instanciam, concretamente, o javali enquanto ente: processos biológicos (as sínteses celulares no seu corpo); processos “históricos” (a vida do javali); processos ecológicos (a relação do corpo-javali com o meio) etc. Não haveria um sujeito ou objeto anterior a estes processos; indivíduos se constituem apenas como um certo limiar na concatenação destes processos mesmos. Assim, o indivíduo é uma escala ou limiar de variações, como uma cor na escala cromática – certo ponto, dado entre um limite, através do qual podemos dizer, ver e reconhecer uma cor como sendo vermelho ou amarelo, por exemplo. O virtual, na filosofia de Deleuze, corresponde a esta dimensão acontecimental que se dá imanentemente ao atual que, por sua vez, corresponde à dimensão empírica e individuada.

(...)

Domenico Uhng, Universidade Fedreal de Goiás, 2016

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