a alma sente o mundo
e o corpo
é o mundo
por isso a estranheza dos afetos
e a velocidade da arte
fazem do tempo
um amor sem jeito
e sem forma
A.M.
Este blog busca problematizar a Realidade mediante a expressão de linhas múltiplas e signos dispersos.
CAPITALISMO MUNDIAL INTEGRADO : O EMPREENDIMENTO DA MORTE
Para entendermos o que está acontecendo, é preciso tomar ao pé da letra a idéia de Walter Benjamin, segundo o qual o capitalismo é, realmente, uma religião, e a mais feroz, implacável e irracional religião que jamais existiu, porque não conhece nem redenção nem trégua. Ela celebra um culto ininterrupto cuja liturgia é o trabalho e cujo objeto é o dinheiro. Deus não morreu, ele se tornou Dinheiro. O Banco – com os seus cinzentos funcionários e especialistas - assumiu o lugar da Igreja e dos seus padres e, governando o crédito (até mesmo o crédito dos Estados, que docilmente abdicaram de sua soberania ), manipula e gere a fé – a escassa, incerta confiança – que o nosso tempo ainda traz consigo. Além disso, o fato de o capitalismo ser hoje uma religião, nada o mostra melhor do que o titulo de um grande jornal nacional (italiano) de alguns dias atrás: “salvar o euro a qualquer preço”. Isso mesmo, “salvar” é um termo religioso, mas o que significa “a qualquer preço”? Até ao preço de “sacrificar” vidas humanas? Só numa perspectiva religiosa (ou melhor, pseudo-religiosa) podem ser feitas afirmações tão evidentemente absurdas e desumanas.
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Giorgio Agamben - trecho de entrevista concedida em 16/08/2012
A escrita rizomática
O rizoma faz o múltiplo, mais do que o anuncia. O fracasso de uma biologia que não fosse molecular, segundo Félix Guattari, em seu livro Revolução molecular, poderia encontrar na botânica os princípios de um rizomorfismo. [1] Em outras palavras, simultaneamente conexões, heterogeneidades, multiplicidades e assignificâncias, o rizoma em sua orfandade radical desenha uma literatura e uma escrita cuja alma, sempre carnal, nervura e gozo sem entraves da língua, na língua, está para além das regenerações, das reproduções das hidras e medusas. Rizoma é só produção, dança das palavras, viagem da língua na língua.Em oposição ao modelo centralizado, coagulado, desidratado e organizado, o rizoma se define como um agenciamento de alianças, sempre pelo meio, e em perpétuo devir. Fazer rizoma é enveredar como um cavalo louco para uma escrita cujo devir é o devir-pensamento-musical da própria escrita. A escrita rizomática é órfã, inclusive, do pecado… Qual foi o castigo maior, a infâmia suprema do Divino contra o homem pecador? Ao pecar, ele nela, ela nele, ambos desaprenderam a cantar. Sem a música, sem a fascinação nela inserida, como uma sina, a escrita torna-se seca, fria, túmulo do pensamento. A escrita não perde apenas o sexo, as sexualidades, os arrepios do gozo, mas seu destino maior: o acontecimento. Ser digno daquilo que nos acontece, afora todo e qualquer axioma moral.
O corpo como pensamento melódico, o corpo como saúde, isto é, como literatura sem o aprisionamento de uma língua que a asfixia na nulidade de uma escritura que se substitui, como um câncer, ao fogo da escrita. A escrita sempre por vir. Ora, saúde, enquanto literatura, consiste em inventar um povo que falta. Cabe, pois, a função fabuladora da escrita de engendrar esse povo que falta, sob o signo de palavras parideiras. Palavras parideiras, disse eu?! Como as “Pedras Parideiras” de Frecha da Mizarela, famosas em Portugal, a escrita rizomática são pedras que parem pedras.
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Daniel Lins
O EXTERMÍNIO DA ALMA - I
Fenômeno modelar das sociedades industriais modernas (plugadas na ideia de progresso ), ele opera nas dobras invisíveis da alma, expondo-a à venda. Tal é o reino da mercadoria. A instituição -ciência comparece com o selo de garantia da verdade. Um culto à morte se instala naturalmente. Verifique as guerras.
A.M.
CURA DA LOUCURA?
“Não. A condição humana não termina nunca. Isso é um sonho. A loucura existe desde a noite dos tempos, como a sexualidade, o suicídio ou a morte. Ela faz parte da condição humana. O que muda é a representação que fazemos dela. Na Idade Média, o louco não tinha o mesmo lugar que tem hoje. O grande movimento se deu quando se considerou, a partir do século 18, que a loucura era uma doença mental. Essa é a mudança. Antes, falava-se em possessão do demônio, que era a expressão entre os antigos, de uma fúria interna ligada ao organismo, etc. Hoje, tudo é considerado do ponto de vista da doença. É a nossa época. Pensava-se que seria vencida, pois poderíamos curá-la, como se cura uma doença. Mas não. E a prova é que se pensava isso também do suicídio, que os remédios venceriam o suicídio. Mas não se pode vencer os grandes dados da condição humana. Ela tomará formas diferentes. A humanidade não pode curar-se do que ela é. Já imaginaram uma sociedade que eliminasse a morte, o suicídio, a loucura, o que mais? Curaríamos a neurose. Mas seríamos o quê, então? O que seria o homem livre de suas paixões? Seria um cemitério!”
Elizabeth Roudinesco, entrevista concedida em 1999, disponível em hhp://www.rodaviva.fapesp.br
OUTRAS PAISAGENS
É possível que a amizade se nutra de observação e de conversa, mas o amor nasce e se alimenta da interpretação silenciosa. O ser amado aparece como um signo, uma "alma"; exprime um mundo possível, desconhecido de nós. O amado implica, envolve, aprisiona um mundo, que é preciso decifrar, isto é, interpretar. Trata-se mesmo de uma pluralidade de mundos; o pluralismo do amor não diz respeito apenas à multiplicidade dos seres amados, mas também à multiplicidade das almas ou dos mundos contidos em cada um deles. Amar é procurar explicar, desenvolver esses mundos desconhecidos que permanecem envolvidos no amado. É por essa razão que é tão comum nos apaixonarmos por mulheres que não são do nosso "mundo", nem mesmo do nosso tipo. Por isso, as mulheres amadas estão muitas vezes ligadas a paisagens que conhecemos tanto a ponto de desejarmos vê-las repetidas nos olhos de uma mulher, mas que se refletem, então, de um ponto de vista tão misterioso que constituem para nós como que países inacessíveis, desconhecidos.
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G. Deleuze in Proust e os signos