domingo, 27 de fevereiro de 2022

À PROCURA  DA  DIFERENÇA

Em saúde mental, conceito que remete ao Fora (funcionamento produtivo e múltiplo das sociedades) e ao pensamento sem imagem (não representativo), a diferença se faz e se tece por linhas invisíveis. Por isso e para isso segue um percurso tortuoso e arriscado onde a poesia talvez se torne a expressão mais intensa do seu corpo supliciado mas sempre alegre. Não é possível identificá-la ("veja, a diferença!") nem assimilá-la a formas sociais estáveis ou a consciências bem intencionadas. Ela não tem identidade, organização visível, protocolo, modelo pronto, rosto único, significante total, mas conteúdos dispersos (desejos) formigando por toda parte. Isso contraria e assusta os guardas perfilados da razão erudita e os moralistas de plantão. A escola, o manicômio (à céu aberto), o direito, a universidade, a pessoa... tantas linhas sedentárias... atormentam o viver com práticas mortuárias. Falamos então de outros universos, sensibilidades desconhecidas, singularidades. Para além dos axiomas da saúde mental e da educação que lhe são correlatos, a diferença só pode ser encontrada no mundo do abstrato, mundo sem forma e ao mesmo tempo real, realíssimo e movido por devires incontroláveis. Eles fluem, morrem e nascem aqui mesmo na Terra, ao nosso lado, dentro de nós.

A.M.

sábado, 26 de fevereiro de 2022

HOLODOMOR | A HISTÓRIA DA FOME UCRANIANA

O que é psiquiatria?   parte 1

A psiquiatria é uma especialidade médica surgida na França em fins do século XVIII. Ai se dá a passagem (conforme Pinel) dos asilos aos manicômios.

No entanto, sua origem mais longínqua remete à existência de asilos no século VII (cultura árabe) e no século XV (ocupação árabe na Espanha). Desde então os asilos (aos poucos) passam a ser chamados de hospícios e se espalham pela Europa.

Sendo assim, a origem da psiquiatria se confunde com a origem dos asilos, dos hospícios e dos manicômios. Uma máquina institucional se prepara para encolher as mentes.

A lógica dos asilos é o DNA da psiquiatria.

Já o século XIX, chamado século dos manicômios, dá origem aos hospitais psiquiátricos conforme o modelo atual.

São conhecidas as agressões e os horrores perpretados contra pacientes internados nos manicômios europeus. Michel Foucault descreve com rigor os detalhes das torturas científicas.

No Brasil, entre outros horrores, o hospital psiquiátrico de Barbacena (criado em 1903) tornou-se um registro histórico e modelo de uma barbárie consentida. O holocausto brasileiro.

No período do estalinismo na União Soviética (1927/1957) presos políticos (quantos?) foram internados em hospitais psiquiátricos. 

No período da ditadura brasileira (1964/1985)  presos políticos (quantos?) foram internados em hospitais psiquiátricos.

A psiquiatria tem uma história pouco edificante.

No Brasil, vieram a reforma psiquiátrica e a luta antimanicomial (em 1978). Mas no campo restante da medicina não há notícia de alguma reforma cardiológica, pneumológica, nefrológica, oftalmológica, etc.

De fato, trata-se de uma especialidade diferente.

A psiquiatria (psicopatologia) não produziu uma teoria dos afetos, apesar da extrema importância desse conceito para o trabalho clínico na construção do vínculo terapêutico com o paciente.

O paciente psiquiátrico muitas vezes não quer ser atendido pelo psiquiatra, sendo levado por familiares ou terceiros. Contudo, na clínica médica não se tem notícia de tal recusa, que por vezes é hostil e agressiva.

O objeto de pesquisa e intervenção clínica da psiquiatria é invisível, impalpável e abstrato. Chamado de “mente” , não há nada parecido em pesquisa médica em termos de metodologia científica.

Nos hospitais psiquiátricos (ainda há!) é muito comum pacientes fugirem. Pulam o muro. Em contraste,  nos hospitais gerais isso não existe. 

Sim, uma estranha especialidade essa.


A.M

Roberta Sá e Ney Matogrosso | "Peito Vazio"

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

domingo, 20 de fevereiro de 2022

O QUE É UMA  PSIQUIATRIA MENOR? 3ª parte (final)

Ela se divorciou da psiquiatria maior (neuro-biológica). Não sob tumulto ou oposição tipo "melhor ou pior", mas como linha prática e clínica produzida na relação com o paciente.  Antes de ser técnica, uma aposta ética lhe move ao fazer o Cuidado cuidar.

A psiquiatria menor intervêm no universo oculto ou semi-oculto dos humilhados mudos. Isso inclui os excluídos ao ar livre, os que vegetam, trastes familiares, párias da mente. Cárceres privados são só um exemplo.

A saúde mental é o objeto de pesquisa dessa psiquiatria (talvez inglória) que se deixa afetar por gritos de angústia, fobia e pânico e por delírios, alucinações de fim de mundo, apocalipse e suicídio.

Uma psiquiatria menor funciona, pois, em equipe, em grupo, no coletivo, mesmo quando o psiquiatra está só. Principalmente quando está só.

Ela não busca reconhecimento científico, intelectual, acadêmico, pretígio, poder, money.  Opera no silêncio dos encontros, no risco das terapêuticas criativas e na loucura do mundo.

Não faz política porque em si mesma já é política, inteiramente política, dos pés à cabeça política e por isso mesmo cultiva alma clandestina e corpo guerreiro. Nem mesmo o grande abraço das camisas de força farmacológicas a intimidam.

Quando sente que o  barco vai virar (ou já virou)  sai a nado em direção a outros mares. Sem terra à vista.


A.M.


 



 


A.M

domingo, 13 de fevereiro de 2022

Uma prece pelos rebeldes de coração enjaulados.


Tennessee Williams

A vida é uma ferida?

O coração lateja?

O sangue é uma parede cega?

E se tudo, de repente?


Eduardo Pitta

LIBERDADE DE EXPRESSÃO - EDUARDO BUENO

As coisas que te cercam, até onde

alcança tua vista, tão passivas

em sua opacidade, que te impedem

de enxergar o (inexistente) horizonte,


que justamente por não serem vivas

se prestam para tudo, e nunca pedem

nem mesmo uma migalha de atenção,

essas coisas que você usa e esquece


assim que larga na primeira mesa —

pois bem: elas vão ficar. Você, não.

Tudo que pensa passa. Permanece

a alvenaria do mundo, o que pesa.


O mais é enchimento, e se consome.

As tais Formas eternas, as Ideias,

e a mente que as inventa, acabam em pó,

e delas ficam, quando muito, os nomes.


Muita louça ainda resta de Pompéia,

mas lábios que a tocaram, nem um só.

As testemunhas cegas da existência,

sempre a te olhar sem que você se importe,


vão assistir sem compaixão nem ânsia,

com a mais absoluta indiferença,

quando chegar a hora, a tua morte.

(Não que isso tenha a mínima importância.)



Paulo Henriques Britto

sábado, 12 de fevereiro de 2022

Declaração Conjunta da Federação Russa e da República Popular da China sobre as Relações Internacionais Entrando em uma Nova Era e o Desenvolvimento Sustentável Global


A convite do Presidente da República Popular da China, Xi Jinping, o Presidente da Federação Russa, Vladimir V. Putin, visitou a China em 4 de fevereiro de 2022. Os Chefes de Estado conversaram em Pequim e participaram da cerimônia de abertura da XXIV Olimpíada dos Jogos de Inverno.


A Federação Russa e a República Popular da China, doravante denominadas “as partes”, declaram o seguinte.


Hoje, o mundo está passando por mudanças importantes, e a humanidade está entrando em uma nova era de rápido desenvolvimento e profunda transformação. Ela vê o desenvolvimento de processos e fenômenos como a multipolaridade, a globalização econômica, o advento da sociedade da informação, a diversidade cultural, a transformação da arquitetura de governança global e da ordem mundial; há crescente inter-relação e interdependência entre os Estados; surgiu uma tendência à redistribuição do poder no mundo; e a comunidade internacional mostra uma demanda crescente por lideranças visando um desenvolvimento pacífico e gradual. Ao mesmo tempo, à medida que a pandemia da infecção pelo novo coronavírus continua, a situação de segurança internacional e regional está se complicando e o número de desafios e ameaças globais está crescendo dia a dia. Alguns atores, que representam uma minoria na escala internacional, continuam recorrendo à força e defendendo abordagens unilaterais para tratar de questões internacionais; interferem nos assuntos internos de outros Estados, infringindo seus direitos e interesses legítimos, e incitam contradições, diferenças e confrontos, dificultando o desenvolvimento e o progresso da humanidade, contra a oposição da comunidade internacional.


As partes pedem a todos os Estados que busquem o bem-estar para todos e, com esse objetivo, construam o diálogo e a confiança mútua, fortaleçam a compreensão mútua, defendam valores humanos universais como paz, desenvolvimento, igualdade, justiça, democracia e liberdade, respeitem o direito dos povos de determinar de maneira independente os caminhos de desenvolvimento de seus países e a soberania e os interesses de segurança e desenvolvimento dos seus Estados, para proteger a arquitetura internacional impulsionada pelas Nações Unidas e a ordem mundial baseada no direito internacional, buscar a multipolaridade genuína com as Nações Unidas e seu Conselho de Segurança desempenhando um papel central e coordenador, promovendo relações internacionais mais democráticas e garantindo a paz, a estabilidade e o desenvolvimento sustentável em todo o mundo.


I


As partes compartilham o entendimento de que a democracia é um valor humano universal, e não um privilégio de um número limitado de Estados, e que sua promoção e proteção é uma responsabilidade comum de toda a comunidade mundial.


As partes acreditam que a democracia é um meio de participação dos cidadãos no governo de seu país com vistas a melhorar o bem-estar da população e implementar o princípio do governo popular. A democracia é exercida em todas as esferas da vida pública como parte de um processo nacional e reflete os interesses de todos os povos, sua vontade, garante seus direitos, atende às suas necessidades e protege seus interesses. Não existe um modelo único para orientar os países no estabelecimento da democracia. Uma nação pode escolher as formas e métodos de implementação da democracia que melhor se adaptem ao seu estado particular, com base em seu sistema social e político, sua história, tradições e características culturais únicas. Cabe apenas ao povo do país decidir se o seu Estado é democrático.


As partes observam que a Rússia e a China, como potências mundiais com rica herança cultural e histórica, têm tradições democráticas de longa data, que contam com mil anos de experiência de desenvolvimento, amplo apoio popular e consideração das necessidades e interesses dos cidadãos. A Rússia e a China garantem ao seu povo o direito de participar por vários meios e de várias formas na administração do Estado e da vida pública de acordo com a lei. Os povos de ambos os países estão convictos sobre a forma que escolheram e respeitam os sistemas democráticos e as tradições de outros Estados.


As partes observam que os princípios democráticos são implementados em nível global, bem como na administração do Estado. Tentativas de alguns Estados de impor seus próprios “padrões democráticos” a outros países, de monopolizar o direito de avaliar o nível de cumprimento de critérios democráticos, de traçar linhas divisórias com base na ideologia, inclusive estabelecendo blocos exclusivos e alianças de conveniência, não passam de desrespeito à democracia e vão contra o espírito e os verdadeiros valores da democracia. Tais tentativas de hegemonia representam sérias ameaças à paz e estabilidade global e regional e minam a estabilidade da ordem mundial.


As partes acreditam que a defesa da democracia e dos direitos humanos não deve ser usada para pressionar outros países. Elas se opõem ao mau uso dos valores democráticos e à interferência nos assuntos internos de Estados soberanos sob o pretexto de proteger a democracia e os direitos humanos, e qualquer tentativa de incitar divisões e confrontos no mundo. As partes pedem à comunidade internacional que respeite a diversidade cultural e civilizacional e os direitos dos povos de diferentes países à autodeterminação. Elas estão prontas para trabalhar em conjunto com todos os parceiros interessados para promover a democracia genuína.


As partes observam que a Carta das Nações Unidas e a Declaração Universal dos Direitos Humanos estabelecem nobres objetivos na área dos direitos humanos universais, estabelecem princípios fundamentais, que todos os Estados devem cumprir e observar na prática. Ao mesmo tempo, como cada nação tem suas próprias características nacionais únicas, história, cultura, sistema social e nível de desenvolvimento social e econômico, a natureza universal dos direitos humanos deve ser vista através do prisma da situação real de cada país em particular, e os direitos humanos devem ser protegidos de acordo com a situação específica de cada país e as necessidades de sua população. A promoção e proteção dos direitos humanos é uma responsabilidade compartilhada da comunidade internacional. Os Estados devem priorizar igualmente todas as categorias de direitos humanos e promovê-los de forma sistêmica. A cooperação internacional em direitos humanos deve ser realizada como um diálogo entre iguais envolvendo todos os países. Todos os Estados devem ter igual acesso ao direito ao desenvolvimento. A interação e a cooperação em questões de direitos humanos devem se basear no princípio da igualdade de todos os países e no respeito mútuo para fortalecer a arquitetura internacional de direitos humanos.


II


As partes acreditam que a paz, o desenvolvimento e a cooperação estão no centro do sistema internacional moderno. O desenvolvimento é um fator-chave para garantir a prosperidade das nações. A pandemia em curso da infecção pelo novo coronavírus representa um sério desafio para o cumprimento da Agenda 2030 da ONU para o Desenvolvimento Sustentável. É vital melhorar as relações de parceria em prol do desenvolvimento global e garantir que a nova etapa do desenvolvimento global seja definida pelo equilíbrio, harmonia e inclusão.


As partes estão buscando avançar em seu trabalho para vincular os planos de desenvolvimento para a União Econômica da Eurásia e a Iniciativa do Cinturão e Rota com o objetivo de intensificar a cooperação prática entre a UEA e a China em várias áreas e promover uma maior interconexão entre a Ásia-Pacífico e as regiões da Eurásia. As partes reafirmam seu foco na construção da Grande Parceria Eurasiática em paralelo e em coordenação com a construção do Cinturão e Rota para promover o desenvolvimento de associações regionais, bem como processos de integração bilateral e multilateral em benefício dos povos do continente eurasiano.


As partes concordaram em continuar intensificando consistentemente a cooperação prática para o desenvolvimento sustentável do Ártico.


As partes fortalecerão a cooperação dentro de mecanismos multilaterais, incluindo as Nações Unidas, e encorajarão a comunidade internacional a priorizar questões de desenvolvimento na coordenação de macropolíticas globais. Elas pedem aos países desenvolvidos que implementem de boa-fé seus compromissos formais de assistência ao desenvolvimento, forneçam mais recursos aos países em desenvolvimento, tratem do desenvolvimento desigual dos Estados, trabalhem para compensar tais desequilíbrios dentro dos Estados e avancem a cooperação global e internacional para o desenvolvimento. O lado russo confirma sua disposição de continuar trabalhando na Iniciativa de Desenvolvimento Global proposta pela China, incluindo a participação nas atividades do Grupo de Amigos da Iniciativa de Desenvolvimento Global sob os auspícios da ONU. A fim de acelerar a implementação da Agenda 2030 da ONU para o Desenvolvimento Sustentável, as partes pedem à comunidade internacional que tome medidas práticas em áreas-chave de cooperação, como redução da pobreza, segurança alimentar, controle de vacinas e epidemias, financiamento para o desenvolvimento, mudança climática, desenvolvimento sustentável, incluindo desenvolvimento verde, industrialização, economia digital e conectividade de infraestrutura.


As partes pedem à comunidade internacional que crie condições abertas, igualitárias, justas e não discriminatórias para o desenvolvimento científico e tecnológico, para intensificar a implementação prática dos avanços científicos e tecnológicos, a fim de identificar novos motores de crescimento econômico.


As partes apelam a todos os países para fortalecer a cooperação em transporte sustentável, construir contatos ativamente e compartilhar conhecimento na construção de instalações de transporte, incluindo transporte inteligente e transporte sustentável, desenvolvimento e uso de rotas do Ártico, bem como desenvolver outras áreas para apoiar a recuperação pós-epidemia.


As partes estão tomando medidas sérias e dando uma importante contribuição para a luta contra as mudanças climáticas. Celebrando conjuntamente o 30º aniversário da adoção da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima, elas reafirmam seu compromisso com esta Convenção, bem como com os objetivos, princípios e disposições do Acordo de Paris, incluindo o princípio de responsabilidades comuns, mas diferenciadas. As partes trabalham juntas para garantir a implementação plena e efetiva do Acordo de Paris, continuam comprometidas em cumprir as obrigações que assumiram e esperam que os países desenvolvidos realmente garantam o fornecimento anual de US$ 100 bilhões em financiamento climático aos estados em desenvolvimento. As partes se opõem à criação de novas barreiras no comércio internacional sob o pretexto de combater as mudanças climáticas.


As partes apoiam fortemente o desenvolvimento da cooperação e intercâmbio internacional no campo da diversidade biológica, participando ativamente do processo de governança global relevante e pretendem promover conjuntamente o desenvolvimento harmonioso da humanidade e da natureza, bem como a transformação verde para garantir o desenvolvimento global sustentável.


Os Chefes de Estado avaliam positivamente a interação efetiva entre Rússia e China nos formatos bilateral e multilateral com foco no combate à pandemia de COVID-19, proteção da vida e da saúde da população dos dois países e dos povos do mundo. Eles aumentarão ainda mais a cooperação no desenvolvimento e fabricação de vacinas contra a nova infecção por coronavírus, bem como medicamentos para seu tratamento, e aumentarão a colaboração em saúde pública e medicina moderna. As partes planejam fortalecer a coordenação sobre medidas epidemiológicas para garantir uma forte proteção da saúde, segurança e ordem nos contatos entre os cidadãos dos dois países. As partes elogiaram o trabalho das autoridades e regiões competentes dos dois países na implementação de medidas de quarentena nas áreas fronteiriças e na garantia do funcionamento estável dos pontos de passagem de fronteira, e pretendem considerar o estabelecimento de um mecanismo conjunto de controle e prevenção de epidemias nas áreas fronteiriças para planejar conjuntamente as medidas anti-epidêmicas a serem tomadas nos postos fronteiriços, compartilhar informações, construir infraestrutura e melhorar a eficiência no desembaraço aduaneiro de mercadorias.


As partes enfatizam que apurar a origem da infecção pelo novo coronavírus é uma questão de ciência. A pesquisa sobre este tema deve ser baseada no conhecimento global, e isso requer cooperação entre cientistas de todo o mundo. Os lados se opõem à politização dessa questão. A parte russa saúda o trabalho realizado em conjunto pela China e pela OMS para identificar a fonte da infecção pelo novo coronavírus e apoia o relatório conjunto China-OMS sobre o assunto. As partes pedem à comunidade global que promova conjuntamente uma abordagem científica séria para o estudo da origem do coronavírus.


A parte russa apoia a realização bem-sucedida, pela parte chinesa, dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Inverno – Pequim 2022.


As partes apreciam muito o nível de cooperação bilateral nos esportes e no movimento olímpico e expressam sua disposição em contribuir para o seu desenvolvimento progressivo.


III


As partes estão seriamente preocupadas com os graves desafios de segurança internacional e acreditam que os destinos de todas as nações estão interconectados. Nenhum Estado pode ou deve garantir sua própria segurança separadamente da segurança do resto do mundo e à custa da segurança de outros Estados. A comunidade internacional deve se engajar ativamente na governança global para garantir uma segurança universal, abrangente, indivisível e duradoura.


As partes reafirmam seu forte apoio mútuo à proteção de seus interesses centrais, soberania estatal e integridade territorial, e se opõem à interferência de forças externas em seus assuntos internos.


A parte russa reafirma seu apoio ao princípio de Uma Só China, confirma que Taiwan é uma parte inalienável da China e se opõe a qualquer forma de independência de Taiwan.


A Rússia e a China se opõem às tentativas de forças externas de minar a segurança e a estabilidade em suas regiões adjacentes comuns, pretendem combater a interferência de forças externas nos assuntos internos de países soberanos sob qualquer pretexto, se opõem às revoluções coloridas e aumentarão a cooperação nas áreas mencionadas.


As partes condenam o terrorismo em todas as suas manifestações, promovem a ideia de criar uma única frente global antiterrorista, com as Nações Unidas desempenhando um papel central, defendem uma coordenação política mais forte e um engajamento construtivo nos esforços multilaterais de contraterrorismo. As partes opõem-se à politização das questões de combate ao terrorismo e à sua utilização como instrumento de política de duplicidade de critérios, condenam a prática de ingerência nos assuntos internos de outros Estados para fins geopolíticos através da utilização de grupos terroristas e extremistas, bem como sob o pretexto de combate ao terrorismo e ao extremismo internacional.


As partes acreditam que determinados Estados, alianças e coalizões militares e políticas buscam obter, direta ou indiretamente, vantagens militares unilaterais em detrimento da segurança de outros, inclusive empregando práticas de concorrência desleal, intensificando a rivalidade geopolítica, alimentando o antagonismo e o confronto, comprometendo seriamente o ordenamento de segurança internacional e a estabilidade estratégica global. As partes opõem-se a um maior alargamento da OTAN e apelam à Aliança do Atlântico Norte para que abandone as suas abordagens ideologizadas da Guerra Fria, respeite a soberania, a segurança e os interesses de outros países, a diversidade das suas origens civilizacionais, culturais e históricas e tenha uma atitude objetiva em relação ao desenvolvimento pacífico de outros Estados. As partes se opõem à formação de estruturas de blocos fechados e campos opostos na região da Ásia-Pacífico e permanecem altamente vigilantes sobre o impacto negativo para a paz e a estabilidade na região da estratégia Indo-Pacífico dos Estados Unidos. A Rússia e a China fizeram esforços consistentes para construir um sistema de segurança equitativo, aberto e inclusivo na região da Ásia-Pacífico (APR) que não seja direcionado contra terceiros países e que promova a paz, a estabilidade e a prosperidade.


As partes saúdam a Declaração Conjunta dos Líderes dos Cinco Estados com Armas Nucleares sobre Prevenção de Guerras Nucleares e Corridas Armamentistas e acreditam que todos os Estados com armas nucleares devem abandonar a mentalidade da guerra fria e os jogos de soma zero, reduzir o papel das armas nucleares em suas políticas de segurança nacional, retirar as armas nucleares implantadas no exterior, eliminar o desenvolvimento irrestrito do sistema global de defesa antimísseis balísticos (ABM) e tomar medidas efetivas para reduzir os riscos de guerras nucleares e quaisquer conflitos armados entre países com capacidades nucleares militares.


As partes reafirmam que o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares é a pedra angular do sistema internacional de desarmamento e não proliferação nuclear, uma parte importante do sistema de segurança internacional do pós-guerra e desempenha um papel indispensável na paz e no desenvolvimento mundial. A comunidade internacional deve promover a implementação equilibrada dos três pilares do Tratado e trabalhar em conjunto para proteger a credibilidade, eficácia e a natureza universal do instrumento.


As partes estão seriamente preocupadas com a parceria de segurança trilateral entre a Austrália, os Estados Unidos e o Reino Unido (AUKUS), que prevê uma cooperação mais profunda entre seus membros em áreas que envolvem estabilidade estratégica, em particular sua decisão de iniciar a cooperação na área de submarinos de propulsão nuclear. Rússia e China acreditam que tais ações são contrárias aos objetivos de segurança e desenvolvimento sustentável da região Ásia-Pacífico, aumentam o perigo de uma corrida armamentista na região e representam sérios riscos de proliferação nuclear. Os lados condenam veementemente tais movimentos e pedem aos participantes do AUKUS que cumpram seus compromissos de não proliferação nuclear e de mísseis e trabalhem de boa-fé juntos para salvaguardar a paz, a estabilidade e o desenvolvimento na região.


Os planos do Japão de liberar água contaminada com energia nuclear da usina nuclear destruída de Fukushima no oceano e o potencial impacto ambiental de tais ações são de grande preocupação para as partes. Os lados enfatizam que o descarte de água contaminada com energia nuclear deve ser tratado com responsabilidade e realizado de maneira adequada, com base em acordos entre o lado japonês e os Estados vizinhos, outras partes interessadas e agências internacionais relevantes, garantindo transparência, raciocínio científico e em acordo com o direito internacional.


As partes acreditam que a retirada dos EUA do Tratado sobre a Eliminação de Mísseis de Alcance Intermediário e de Curto Alcance, a aceleração da pesquisa e o desenvolvimento de mísseis terrestres de alcance intermediário e curto e o desejo de implantá-los em regiões da Ásia-Pacífico e da Europa, bem como a sua transferência para os aliados, acarretam um aumento da tensão e desconfiança, aumentam os riscos para a segurança internacional e regional, levam ao enfraquecimento do sistema internacional de não proliferação e controle de armas, minando a estabilidade estratégica global. As partes pedem que os Estados Unidos respondam positivamente à iniciativa russa e abandonem seus planos de implantar mísseis terrestres de alcance intermediário e curto na região da Ásia-Pacífico e na Europa. As partes continuarão a manter contatos e fortalecer a coordenação nesta questão.


A parte chinesa é solidária e apoia as propostas apresentadas pela Federação Russa para criar garantias de segurança juridicamente vinculativas de longo prazo na Europa.


As partes observam que o abandono pelos Estados Unidos de uma série de importantes acordos internacionais de controle de armas tem um impacto extremamente negativo na segurança e estabilidade internacional e regional. As partes expressam preocupação com o avanço dos planos dos EUA para desenvolver uma defesa antimísseis global e implantar seus elementos em várias regiões do mundo, combinado com a capacitação de armas não nucleares de alta precisão para ataques preventivos e outros objetivos estratégicos. Os lados enfatizam a importância do uso pacífico do espaço sideral, apoiam fortemente o papel central do Comitê das Nações Unidas sobre os Usos Pacíficos do Espaço Exterior na promoção da cooperação internacional, mantendo e desenvolvendo leis e regulamentos espaciais internacionais no campo das atividades espaciais. A Rússia e a China continuarão a aumentar a cooperação em assuntos de interesse mútuo, como a sustentabilidade de longo prazo das atividades espaciais e o desenvolvimento e uso de recursos espaciais. As partes se opõem às tentativas de alguns Estados de transformar o espaço sideral em uma arena de confronto armado e reiteram sua intenção de fazer todos os esforços necessários para evitar o armamento do espaço e uma corrida armamentista no espaço sideral. Elas vão neutralizar as atividades destinadas a alcançar a superioridade militar no espaço e usá-la para operações de combate. As partes afirmam a necessidade do início precoce das negociações para concluir um instrumento multilateral juridicamente vinculativo baseado no projeto de tratado russo-chinês sobre a prevenção da colocação de armas no espaço sideral e o uso ou ameaça do uso da força contra objetivos espaciais que forneçam garantias confiáveis ​​contra uma corrida armamentista e o armamento do espaço sideral.


A Rússia e a China enfatizam que medidas apropriadas de transparência e construção de confiança, incluindo uma iniciativa internacional/compromisso político de não ser o primeiro a colocar armas no espaço, também podem contribuir para o objetivo de evitar uma corrida armamentista no espaço sideral, mas tais medidas devem complementar e não substituir o regime juridicamente vinculativo efetivo que rege as atividades espaciais.


As partes reafirmam sua crença de que a Convenção sobre a Proibição do Desenvolvimento, Produção e Armazenagem de Armas Bacteriológicas (Biológicas) e Toxinas e sobre sua Destruição (BWC) é um pilar essencial da paz e segurança internacionais. A Rússia e a China ressaltam sua determinação em preservar a credibilidade e eficácia da Convenção.


As partes afirmam a necessidade de respeitar plenamente e fortalecer ainda mais o BWC, inclusive institucionalizando-o, fortalecendo seus mecanismos e adotando um Protocolo juridicamente vinculativo à Convenção com um mecanismo de verificação eficaz, bem como por meio de consultas e cooperação regulares para abordar quaisquer questões relacionadas com a implementação da Convenção.


As partes enfatizam que as atividades de armas biológicas domésticas e estrangeiras pelos Estados Unidos e seus aliados levantam sérias preocupações e questões para a comunidade internacional em relação ao cumprimento da BWC. As partes compartilham a opinião de que tais atividades representam uma séria ameaça à segurança nacional da Federação Russa e da China e são prejudiciais à segurança das respectivas regiões. As partes pedem aos EUA e seus aliados que ajam de maneira aberta, transparente e responsável, relatando adequadamente suas atividades biológicas militares realizadas no exterior e em seu território nacional, e apoiando a retomada das negociações sobre um Protocolo BWC juridicamente vinculativo com um mecanismo de verificação eficaz.


As partes, reafirmando seu compromisso com a meta de um mundo livre de armas químicas, conclamam todas as partes da Convenção sobre Armas Químicas a trabalharem juntas para manter sua credibilidade e eficácia. A Rússia e a China estão profundamente preocupadas com a politização da Organização para a Proibição de Armas Químicas e pedem a todos os seus membros que fortaleçam a solidariedade e a cooperação e protejam a tradição de tomada de decisão consensual. A Rússia e a China insistem que os Estados Unidos, como único Estado Parte da Convenção que ainda não concluiu o processo de eliminação das armas químicas, acelerem a eliminação de seus estoques de armas químicas. As partes enfatizam a importância de equilibrar as obrigações de não proliferação dos Estados com os interesses da cooperação internacional legítima no uso de tecnologia avançada e materiais e equipamentos relacionados para fins pacíficos. As partes observam a resolução intitulada “Promovendo a Cooperação Internacional para Usos Pacíficos no Contexto da Segurança Internacional” adotada na 76ª sessão da Assembleia Geral da ONU por iniciativa da China e co-patrocinada pela Rússia, e aguardam sua implementação consistente em acordo com as metas nele estabelecidas.


As partes atribuem grande importância às questões de governança no campo da inteligência artificial. As partes estão prontas para fortalecer o diálogo e os contatos sobre inteligência artificial.


As partes reiteram sua disposição de aprofundar a cooperação no campo da segurança da informação internacional e contribuir para a construção de um ambiente de ICT (Information and Communications Technology – Tecnologia da informação e Comunicação, Nota da Redação do i21) aberto, seguro, sustentável e acessível. As partes enfatizam que os princípios de não uso da força, respeito à soberania nacional e aos direitos e liberdades humanos fundamentais, e não ingerência nos assuntos internos de outros Estados, consagrados na Carta da ONU, são aplicáveis ao espaço da informação. A Rússia e a China reafirmam o papel fundamental da ONU na resposta às ameaças à segurança da informação internacional e expressam seu apoio à Organização no desenvolvimento de novas normas de conduta dos Estados nessa área.


As partes saúdam a implementação do processo de negociação global sobre segurança da informação internacional dentro de um único mecanismo e apoiam, neste contexto, o trabalho do Grupo de Trabalho Aberto da ONU sobre segurança e uso de tecnologias de informação e comunicação (ICTs) 2021– 2025 (OEWG) e expressam sua vontade de falar a uma só voz dentro dele. As partes consideram necessário consolidar os esforços da comunidade internacional para desenvolver novas normas de comportamento responsável dos Estados, inclusive as legais, bem como um instrumento jurídico internacional universal que regule as atividades dos Estados no campo das ICTs. As partes acreditam que a Iniciativa Global sobre Segurança de Dados, proposta pelo lado chinês e apoiada, em princípio, pelo lado russo, fornece uma base para o Grupo de Trabalho discutir e elaborar respostas a ameaças à segurança de dados e outras ameaças à segurança internacional da informação.


As partes reiteram seu apoio às resoluções 74/247 e 75/282 da Assembleia Geral das Nações Unidas, apoiam o trabalho do Comitê Ad Hoc relevante de Peritos Governamentais, facilitam as negociações dentro das Nações Unidas para a elaboração de uma convenção internacional sobre o combate ao uso das ICTs para fins criminais. As partes encorajam a participação construtiva de todas as partes nas negociações, a fim de chegar a um acordo o mais rápido possível sobre uma convenção crível, universal e abrangente e fornecê-la à Assembleia Geral das Nações Unidas em sua 78ª sessão em estrita conformidade com a resolução 75/282. Para esses fins, a Rússia e a China apresentaram um projeto de convenção conjunto como base para as negociações.


As partes apoiam a internacionalização da governança da Internet, defendem direitos iguais em relação a sua governança, acreditam que quaisquer tentativas de limitar seu direito soberano de regular segmentos nacionais da Internet e garantir sua segurança são inaceitáveis, estão interessados em uma maior participação da União Internacional de Telecomunicações na abordagem dessas questões.


As partes pretendem aprofundar a cooperação bilateral em segurança da informação internacional com base no acordo intergovernamental relevante de 2015. Para este fim, as partes concordaram em adotar em um futuro próximo um plano de cooperação entre a Rússia e a China nesta área.


IV


As partes sublinham que a Rússia e a China, como potências mundiais e membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas, pretendem aderir firmemente aos princípios morais e aceitar sua responsabilidade, defendem fortemente o sistema internacional com o papel central de coordenação das Nações Unidas nos assuntos internacionais , defendem a ordem mundial baseada no direito internacional, incluindo os propósitos e princípios da Carta das Nações Unidas, para avançar a multipolaridade e promover a democratização das relações internacionais e, juntos, criar um mundo ainda mais próspero, estável e justo, construindo em conjunto as relações internacionais de um novo tipo.


A parte russa destaca a importância do conceito de construção de uma “comunidade de destino comum para a humanidade” proposta pela parte chinesa para garantir maior solidariedade da comunidade internacional e a consolidação de esforços para responder aos desafios comuns. O lado chinês observa a importância dos esforços do lado russo para estabelecer um sistema multipolar justo de relações internacionais.


As partes pretendem defender fortemente os resultados da Segunda Guerra Mundial e a ordem mundial existente no pós-guerra, defender a autoridade das Nações Unidas e a justiça nas relações internacionais, resistir às tentativas de negar, distorcer e falsificar a história da Segunda Guerra Mundial.


As partes pedem o estabelecimento de um novo tipo de relacionamento entre as potências mundiais com base no respeito mútuo, coexistência pacífica e cooperação mutuamente benéfica. Reafirmam que as novas relações interestatais entre Rússia e China são superiores às alianças políticas e militares da época da Guerra Fria. A amizade entre os dois Estados não tem limites, não há áreas “proibidas” de cooperação, o fortalecimento da cooperação estratégica bilateral não visa países terceiros nem é afetado pela mudança do ambiente internacional e mudanças circunstanciais em países terceiros.


As partes reiteram a necessidade de consolidação, não de divisão da comunidade internacional, a necessidade de cooperação, não de confronto. As partes se opõem ao retorno das relações internacionais ao estado de confronto entre grandes potências, quando os fracos são vítimas dos fortes. As partes pretendem resistir às tentativas de substituir formatos e mecanismos universalmente reconhecidos e consistentes com o direito internacional por regras elaboradas em privado por certas nações ou blocos de nações, e são contra a abordagem indireta e sem consenso de problemas internacionais, opõem-se à política de poder, bullying, sanções e aplicação extraterritorial de jurisdição, bem como o abuso de políticas de controle de exportação, e apoiam a facilitação do comércio de acordo com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC).


As partes reafirmaram a intenção de fortalecer a coordenação da política externa, buscar o verdadeiro multilateralismo, fortalecer a cooperação em plataformas multilaterais, defender interesses comuns, apoiar o equilíbrio de poder internacional e regional e melhorar a governança global.


As partes apoiam e defendem o sistema multilateral de comércio baseado no papel central da Organização Mundial do Comércio (OMC), participam ativamente da reforma da OMC, opondo-se a abordagens unilaterais e protecionistas. As partes estão prontas para fortalecer o diálogo entre os parceiros e coordenar posições sobre questões comerciais e econômicas de interesse comum, contribuir para garantir a operação sustentável e estável das cadeias de valor globais e regionais, promover um sistema de relacionamento mais aberto, inclusivo, transparente e não discriminatório de regras econômicas e comércio internacional.


As partes apoiam o formato do G20 como um importante fórum para discutir questões de cooperação econômica internacional e medidas de resposta à crise, promovem conjuntamente o revigorado espírito de solidariedade e cooperação dentro do G20, apoiam o papel de liderança da associação em áreas como a luta internacional contra epidemias, recuperação econômica mundial, desenvolvimento sustentável inclusivo, melhoria do sistema de governança econômica global de maneira justa e racional para enfrentar coletivamente os desafios globais.


As partes apoiam a parceria estratégica aprofundada dentro do BRICS, promovem a cooperação ampliada em três áreas principais: política e segurança, economia e finanças e intercâmbios humanitários. Em particular, Rússia e China pretendem incentivar a interação nos campos da saúde pública, economia digital, ciência, inovação e tecnologia, incluindo tecnologias de inteligência artificial, bem como o aumento da coordenação entre os países do BRICS em plataformas internacionais. Os lados se esforçam para fortalecer ainda mais o formato BRICS Plus/Outreach como um mecanismo eficaz de diálogo com associações e organizações de integração regional de países em desenvolvimento e Estados com mercados emergentes.


A parte russa apoiará totalmente o lado chinês que preside a associação em 2022 e ajudará na realização frutífera da XIV cúpula do BRICS.


A Rússia e a China pretendem fortalecer de forma abrangente a Organização de Cooperação de Xangai (SCO) e aprimorar ainda mais seu papel na formação de uma ordem mundial policêntrica baseada nos princípios universalmente reconhecidos do direito internacional, multilateralismo, segurança igualitária, conjunta, indivisível, abrangente e sustentável.


Os dois países consideram importante implementar consistentemente os acordos sobre mecanismos aprimorados para combater os desafios e ameaças à segurança dos estados membros da SCO e, no contexto de abordar essa tarefa, defendem a ampliação da funcionalidade da Estrutura Antiterrorista Regional da SCO.


As partes contribuirão para conferir uma nova qualidade e dinâmica à interação econômica entre os Estados membros da SCO nas áreas de comércio, manufatura, transporte, energia, finanças, investimento, agricultura, alfândega, telecomunicações, inovação e outras áreas de interesse mútuo, inclusive através do uso de tecnologias “verdes” avançadas, economizadoras de recursos e energeticamente eficientes.


As partes observam a interação frutífera dentro da SCO sob o Acordo de 2009 entre os Governos dos Estados membros da Organização de Cooperação de Xangai sobre cooperação no campo da segurança da informação internacional, bem como dentro do Grupo especializado de Peritos. Nesse contexto, saúdam a adoção, em 17 de setembro de 2021 em Dushanbe, do Plano de Ação Conjunta da SCO para Garantir a Segurança da Informação Internacional para 2022–2023 pelo Conselho de Chefes de Estado dos Estados Membros da SCO.


A Rússia e a China valorizam a importância cada vez maior da cooperação cultural e humanitária para o desenvolvimento progressivo da SCO. A fim de fortalecer o entendimento mútuo entre os povos dos Estados membros da SCO, os dois países continuarão a promover efetivamente a interação em áreas como laços culturais, educação, ciência e tecnologia, saúde, proteção ambiental, turismo, contatos interpessoais, esportes.


A Rússia e a China continuarão a trabalhar para fortalecer o papel da APEC (Ásia-Pacific Economic Cooperation – Cooperação Econômica Ásia-Pacífico, Nota da Redação do i21) como plataforma líder para o diálogo multilateral sobre questões econômicas na região da Ásia-Pacífico. As partes pretendem intensificar a ação coordenada para implementar com sucesso as “diretrizes Putrajaya para o desenvolvimento da APEC até 2040”, com foco na criação de um ambiente de comércio e investimento livre, aberto, justo, não discriminatório, transparente e estável na região. Será dada especial ênfase à luta contra a pandemia de infecção pelo novo coronavírus e à recuperação econômica, a digitalização de uma ampla gama de diferentes esferas da vida, o crescimento econômico em territórios remotos e o estabelecimento de interação entre a APEC e outras associações multilaterais regionais com uma agenda semelhante.


As partes pretendem desenvolver a cooperação no formato “Rússia-Índia-China”, bem como fortalecer a interação em locais como a Cúpula do Leste Asiático, Fórum Regional de Segurança da ASEAN, Reunião de Ministros da Defesa dos Estados Membros da ASEAN e Parceiros de Diálogo. A Rússia e a China apoiam o papel central da ASEAN no desenvolvimento da cooperação no Leste Asiático, continuam a aumentar a coordenação no aprofundamento da cooperação com a ASEAN e promovem conjuntamente a cooperação nas áreas de saúde pública, desenvolvimento sustentável, combate ao terrorismo e combate ao crime transnacional. As partes pretendem continuar a trabalhar no interesse de um papel reforçado da ASEAN como elemento-chave da arquitetura regional.


Pequim, 04/02/2022

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

Adriana Calcanhotto | Era Pra Ser

ESTUDO SOBRE AS PSICOSES - II

Sob a ótica da diferença, a experiência psicótica substitui a entidade clínica "psicose". Para além dos sufixos de virose, micose, artrose, tuberculose etc, o modelo biomédico se desfaz em prol de uma relação de implicação com a Realidade: a diferença. Mas, de que realidade se trata? A experiência psicótica responde: da realidade do delírio. É nele que formiga a singularidade psicótica e só através da análise desse processo existencial complexo ( o louco) é que a psiquiatria poderá "compreender o incompreensível". Para isso acontecer, deve se tornar louca, não psicótica. Esta vivência, (tanto para o técnico quanto para o paciente), prenhe de afeto e crença, tem na esquizofrenia o arqui-modelo das psicoses ( a loucura) onde a dissolução do sentido faz do delírio não um sintoma, mas o próprio paciente. Assim, as psicoses remetem à experiência do não sentido expresso como sentido (regime semiótico) em múltiplos graus de recusa à Realidade. No fim das contas, se seguirmos os códigos da medicina psiquiátrica, conceituar uma psicose não só é difícil, mas impossível. Resta a diferença, transdisciplinar e não identitária, conectar com o psicótico via saberes fora da psiquiatria, mas que a atravessam e a constituem como prática clínica. É esse o caminho (método) para explorar estranhos universos. 


A.M

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2022

O QUE É UMA PSIQUIATRIA MENOR? - parte 2

É uma psiquiatria do desejo. Não o desejo como falta, carência, incompletude, mas o desejo como produção, produção de produção. É que o desejo quer sempre mais, novas conexões, outros desejos. Desejar o desejo, produzir desejo é o que lhe resta fazer.

Mas desejar não é fácil. Um trabalho imperceptível, talvez invisível, fabrica linhas da diferença em meio ao rumor dos tempos sombrios. 

Mil disfarces são necessários à sua prática. A camuflagem torna-se uma função guerreira.

Uma psiquiatria menor vive nas e das intensidades poéticas da loucura, não da loucura-doença mas da loucura como experiência de abertura aos signos que vêm de fora.

Eles são os da Terra e dos corpos supliciados.

A ética só existe (a ser criada) como ato clínico na psicopatologia.  Não há, pois, um código de ética pronto e juramentado como o da medicina. A referência é o paciente: uma vida.

Um paciente são multidões. Não há o indivíduo. 

Uma psiquiatria menor só funciona no desejo, com o desejo e pelo desejo. Assim como a ética, o desejo não preexiste.  Construi-lo dá trabalho.


A.M. 







quinta-feira, 3 de fevereiro de 2022

Biblioteca falsa de desembargador despenca durante sessão no AM

Biodiversidade


Há maneiras mais fáceis de se expor ao ridículo,

que não requerem prática, oficina, suor.

Maneiras mais simpáticas de pagar mico

e dizer olha eu aqui, sou único, me amem por favor.


Porém a quem se preste a esse papel esdrúxulo,

como há quem não se vexe de ler e decifrar,

essas palavras bestas estrebuchando inúteis,

cágados com as quatro patas viradas pro ar.


Então essa fala esquisita, aparentemente anárquica,

de repente é mais que isso, é uma voz, talvez,

do outro lado da linha formigando de estática,

dizendo algo mais que testando, testando, um dois três,


câmbio? Quem sabe esses cascos invertidos,

incapazes de reassumir a posição natural,

não são na verdade uma outra forma de vida,

tipo um ramo alternativo do reino animal?


Paulo Henriques Britto

Live 01/02/2022 - Números do Brasil voltam a piorar e variante BA.2 - 22...

TEMOR AO DESEJO


Os desejos edipianos não são de maneira alguma recalcados, nem têm de sê-lo. Porém, estão numa relação íntima com o recalcamento, mas de outro modo. Eles são o engodo ou a imagem desfigurada com que o recalcamento arma uma cilada ao desejo. Se o desejo é recalcado, não é por ser desejo da mãe e da morte do pai; ao contrário, ele só devém isso porque é recalcado e só aparece com essa máscara sob o recalcamento que a modela e nele a coloca. Aliás, pode-se duvidar que o incesto seja um verdadeiro obstáculo à instauração da sociedade, como dizem os partidários de uma concepção de sociedade baseada na troca. Vê-se cada coisa... O verdadeiro perigo não é este. Se o desejo é recalcado é porque toda posição de desejo, por menor que seja, pode pôr em questão a ordem estabelecida de uma sociedade: não que o desejo seja a-social, ao contrário. Mas ele é perturbador; não há posição de máquina desejante que não leve setores sociais inteiros a explodir. Apesar do que pensam certos revolucionários, o desejo é, na sua essência, revolucionário — o desejo, não a festa! — e nenhuma sociedade pode suportar uma posição de desejo verdadeiro sem que suas estruturas de exploração, de sujeição e de hierarquia sejam comprometidas. Se uma sociedade se confunde com essas estruturas (hipótese divertida), então, sim, o desejo a ameaça essencialmente. Portanto, é de importância vital para uma sociedade reprimir o desejo, e mesmo achar algo melhor do que a repressão, para que até a repressão, a hierarquia, a exploração e a sujeição sejam desejadas. É lastimável ter de dizer coisas tão rudimentares: o desejo não ameaça a sociedade por ser desejo de fazer sexo com a mãe, mas por ser revolucionário. E isto não quer dizer que o desejo seja distinto da sexualidade, mas que a sexualidade e o amor não dormem no quarto de Édipo; eles sonham, sobretudo, com outras amplidões e fazem passar estranhos fluxos que não se deixam estocar numa ordem estabelecida. O desejo não “quer” a revolução, ele é revolucionário por si mesmo, e como que involuntariamente, só por querer aquilo que quer. Desde o começo deste estudo, sustentamos, ao mesmo tempo, que a produção social e a produção desejante são uma só coisa, mas que diferem em regime, de modo que uma forma social de produção exerce uma repressão essencial sobre a produção desejante, e também que a produção desejante (um “verdadeiro” desejo) pode potencialmente explodir a forma social.

(...)

G. Deleuze e F. Guattari in O anti-édipo