quinta-feira, 25 de setembro de 2014

DEVIR MOLECULAR

Pode ser que um cachorro exercite seu maxilar no ferro, mas então ele 
exercita seu maxilar como órgão molar. Quando Lolito come ferro, é 
inteiramente diferente: ele compõe seu maxilar com o ferro de modo que ele 
próprio se torne um maxilar de cachorro-molecular. O ator De Niro, numa 
seqüência de filme, anda "como" um caranguejo; mas não se trata, ele diz, de 
imitar o caranguejo; trata-se de compor com a imagem, com a velocidade da 
imagem, algo que tem a ver com o caranguejo. E é isso o essencial para 
nós: ninguém torna-se-animal a não ser que, através de meios e de elementos 
quaisquer, emita corpúsculos que entrem na relação de movimento e repouso 
das partículas animais, ou, o que dá no mesmo, na zona de vizinhança da 
molécula animal. Ninguém se torna animal senão molecular. Ninguém se 
torna cachorro molar latindo, mas, ao latir, se isso é feito com bastante 
coração, necessidade e composição, emite-se um cachorro molecular. O 
homem não se torna lobo, nem vampiro, como se mudasse de espécie molar; 
mas o vampiro e o lobisomem são devires do homem, isto é, vizinhanças 
entre moléculas compostas, relações de movimento e repouso, de velocidade 
e lentidão, entre partículas emitidas. É claro que há lobisomens, vampiros, 
dizê-mo-lo de todo coração, mas não procure aí a semelhança ou a analogia 
com o animal, pois trata-se do devir-animal em ato, trata-se da produção do 
animal molecular (enquanto que o animal "real" é tomado em sua forma e 
sua subjetividade molares). 

Deleuze-Guattari in Mil Platôs

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