Pode ser que um cachorro exercite seu maxilar no ferro, mas então ele
exercita seu maxilar como órgão molar. Quando Lolito come ferro, é
inteiramente diferente: ele compõe seu maxilar com o ferro de modo que ele
próprio se torne um maxilar de cachorro-molecular. O ator De Niro, numa
seqüência de filme, anda "como" um caranguejo; mas não se trata, ele diz, de
imitar o caranguejo; trata-se de compor com a imagem, com a velocidade da
imagem, algo que tem a ver com o caranguejo. E é isso o essencial para
nós: ninguém torna-se-animal a não ser que, através de meios e de elementos
quaisquer, emita corpúsculos que entrem na relação de movimento e repouso
das partículas animais, ou, o que dá no mesmo, na zona de vizinhança da
molécula animal. Ninguém se torna animal senão molecular. Ninguém se
torna cachorro molar latindo, mas, ao latir, se isso é feito com bastante
coração, necessidade e composição, emite-se um cachorro molecular. O
homem não se torna lobo, nem vampiro, como se mudasse de espécie molar;
mas o vampiro e o lobisomem são devires do homem, isto é, vizinhanças
entre moléculas compostas, relações de movimento e repouso, de velocidade
e lentidão, entre partículas emitidas. É claro que há lobisomens, vampiros,
dizê-mo-lo de todo coração, mas não procure aí a semelhança ou a analogia
com o animal, pois trata-se do devir-animal em ato, trata-se da produção do
animal molecular (enquanto que o animal "real" é tomado em sua forma e
sua subjetividade molares).
Deleuze-Guattari in Mil Platôs
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