Vi morrer a esperança de um mundo melhor
Durante os vinte primeiros anos da minha vida, cresci num mundo onde o destino das crianças parecia ser naturalmente mais feliz do que o dos seus pais; no decurso dos trinta anos que se lhes sucederam, assisti à morte da promessa de um mundo melhor. No tempo de uma só geração, a quase certeza do progresso esbateu-se pouco a pouco perante a evidência de uma regressão social, ecológica, moral e política, uma “Grande Regressão” que já é tempo de designar e representar para que possamos combatê-la.
Porque a arma principal dos doentes e predadores que orquestram esta tragédia é a sua capacidade de apresentá-la como o novo rosto do progresso. E a sua principal aliada é a permeabilidade dos espíritos angustiados, facilmente dispostos a aceitar qualquer fábula que faça baixar de um grau a pressão e a angústia que os devoram. Na época da democracia de opinião, os espíritos reaccionários não podem contentar-se com a demolição dos adquiridos das conquistas passadas em favor de uma vida melhor para todos; é-lhes necessário também anestesiar as suas resistências, suscitar a adesão ou, pelo menos, a resignação das suas próprias vítimas; precisam ganhar uma batalha cultural em que aquilo que está em jogo é a tentativa, tantas vezes, vitoriosa de nos fazer amar a decadência.
É assim que esperam, por exemplo, persuadir-nos de que a necessidade de “trabalhar mais para ganhar mais” representa um avanço social, a renúncia voluntária aos nossos direitos sociais alarga a nossa liberdade, que a construção de estabelecimentos prisionais para crianças melhora a nossa segurança, que a expansão dos bio-carburantes contribui para o “desenvolvimento sustentado”, etc. Mas a substância real deste pretensos “progressos” é a intensificação do trabalho, a servidão voluntária, a incapacidade de educar os nossos filhos e a destruição das florestas virgens! Se permitirmos que se instale esta fatal perversão do discurso político, então, de cada vez que se nos anuncia uma “nova liberdade”, devemos temer uma alienação suplementar dos nossos direitos e cada reforma para “avançar mais um pouco”, pode mascarar um enorme passo atrás. São incontáveis as regressões que hoje avançam, mesmo sem sentir a necessidade de se mascarar: as “democracias liberais” laminam as liberdades públicas, metem nas prisões as crianças e os loucos, invadem países que não lhes causaram nenhum dano; os trabalhadores morrem no trabalho e não apenas em sentido metafórico; o fundamentalismo religioso e o obscurantismo prosperam; a incivilidade invade as ruas e os pátios de recreio; a cupidez obscena dos ricos destrói os sistemas financeiros e reduz os países pobres à miséria, etc. Para onde quer que olhemos, não podemos deixar de ver como um movimento regressivo se apodera do que até muito recentemente havíamos chamado “o progresso”.
(...)
Jacques Genereux in A Grande Depressão,2011
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