quarta-feira, 7 de setembro de 2022

DEUS E O ESTADO

Três elementos ou três princípios fundamentais constituem, na

história, as condições essenciais de todo desenvolvimento humano,

coletivo ou individual: 1º) a animalidade humana; 2º) o pensamento;

3º) a revolta. À primeira corresponde propriamente a economia

social e privada; à segunda, a ciência; à terceira, a liberdade.

Os idealistas de todas as escolas, aristocratas e burgueses,

teólogos e metafísicos, políticos e moralistas, religiosos, filósofos

ou poetas, sem esquecer os economistas liberais, adoradores

desmedidos do ideal, como se sabe, ofendem-se muito quando se

lhes diz que o homem, com sua inteligência magnífica, suas idéias

sublimes e suas aspirações infinitas, nada mais é, como tudo o que

existe neste inundo, que um produto da vil matéria.

Poderíamos responder-lhes que a matéria da qual falam os

materialistas, matéria espontaneamente, eternamente móvel, ativa,

produtiva, a matéria química ou organicamente determinada e

manifesta pelas propriedades ou pelas forças mecânicas, físicas,

animais e inteligentes, que lhe são forçosamente inerentes, esta

matéria nada tem de comum com a vil matéria dos idealistas. Esta

última, produto de falsa abstração, é efetivamente uma coisa

estúpida, inanimada, imóvel, incapaz de dar vida ao mínimo produto,

um caput mortuum, uma infame imaginação oposta a esta bela

imaginação que eles chamam Deus; em relação ao Ser supremo, a

matéria, a matéria deles, despojada por eles mesmos de tudo o que

constitui sua natureza real, representa necessariamente o supremo

nada. Eles retiraram da matéria a inteligência, a vida, todas as

qualidades determinantes, as relações ativas ou as forças, o próprio

movimento, sem o qual a matéria sequer teria peso, nada lhe

deixando da impenetrabilidade e da imobilidade absoluta no espaço;

eles atribuíram todas estas forças, propriedades ou manifestações

naturais ao ser imaginário criado por sua fantasia abstrativa; em

seguida, invertendo os papéis, denominaram este produto de sua

imaginação, este fantasma, este Deus que é o nada, "Ser supremo";

e, por conseqüência necessária, declararam que o Ser real, a

matéria, o mundo, era o nada. Depois disso eles vêm nos dizer

gravemente que esta matéria é incapaz de produzir qualquer coisa

que seja, até mesmo colocar-se em movimento por si mesma, e que

por conseqüência deve ter sido criada por seu Deus. 

(...)

M.Bakunin, 1882

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