quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

SOB QUALQUER REGIME DE SIGNOS

(...) Escrever é talvez trazer à luz esse agenciamento do inconsciente, selecionar as vozes sussurrantes, convocar as tribos e os idiomas secretos, de onde extraio algo que denomino Eu (Moi). EU (JE) é uma palavra de ordem. Um esquizofrênico declara: "ouvi vozes dizendo: ele tem consciência da vida" . Existe então, nesse sentido, um cogito esquizofrênico, mas que faz da consciência de si a transformação incorpórea de uma palavra de ordem ou o resultado de um discurso indireto. Meu discurso direto é ainda o discurso indireto livre que me percorre de um lado a outro, e que vem de outros mundos ou de outros planetas. É por isso que tantos artistas e tantos escritores foram tentados pela experiência do copo que se move na mesa. Conseqüentemente, quando perguntamos qual é a faculdade própria à palavra de ordem, devemos reconhecer nela características estranhas: uma espécie de instantaneidade na emissão, na percepção e na transmissão das palavras de ordem; uma grande variabilidade, e uma potência de esquecimento que faz com que nos sintamos inocentes diante das palavras de ordem que seguimos, e depois abandonamos, para acolher outras em seu lugar; uma capacidade propriamente ideal ou fantasmática na apreensão das transformações incorpóreas; uma aptidão para apreender a linguagem sob a forma de um imenso discurso indireto . Faculdade do ponto no teatro e de quem o escuta, faculdade da canção que coloca sempre uma ária em uma ária, em uma relação de redundância, faculdade mediúnica na verdade, glossolálica ou xenoglóssica. 
(...)
G. Deleuze e F. Guattari in Mil platôs, vol.2

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