PARADA
A Bíblia me ensinou; "Cada coisa tem seu tempo." Paro hoje - em verdade parei ontem - o ciclo de pequenas lições de civismo para cego-surdo-mudos. Paro porque há uma hora de parar. Espero em Deus não ter que recomeçar. Foi bom sentir que alguns puderam ver, outros ouvir, uns raros se indignar. Quando surgem vozes mais competentes e aparelhadas do que a minha, cedo a vez. E posso dar ao meu leitor (na presunção de tê-los) descanso do enfado a que o submeti por tema, atualmente, quase irrelevante; a prepotência a serviço do crime. Paro com a melancolia de perder a admiração que tinha por dois ou três amigos. Paro com a satisfação de que, por mais erros que cometa, por mais contaminada que esteja pela metástase do país - nenhum de nós escapa - ainda é na imprensa, e quase só na imprensa, que o cidadão encontra um espaço de choque contra a insensibilidade patológica do nosso poder político-econômico.
Millôr Fernandes
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