FLUXOS DO DESEJO
(...)
De maneira profunda, Lawrence mostra que a sexualidade,
incluindo a castidade, é uma questão de fluxos, “uma infinidade
de fluxos diferentes e até opostos”. Tudo depende da maneira como
esses fluxos, seja qual for o objeto, a fonte e o objetivo, são
codificados e cortados segundo figuras constantes ou, ao contrário,
tomados em cadeias de descodificação que os recortam segundo
pontos móveis e não figurativos (os fluxos-esquizas). Lawrence
critica a pobreza das imagens idênticas imutáveis, papéis figurativos
que são outros tantos estrangulamentos dos fluxos de sexualidade:
“noiva, amante, mulher, mãe” — poder-se-ia também dizer
“homossexuais, heterossexuais” etc. — todos esses papéis são distribuídos
pelo triângulo edipiano pai-mãe-eu, um eu representativo
que se supõe definir-se em função das representações pai-mãe,
por fixação, regressão, assunção, sublimação — e tudo isso sob
que regra? A regra do grande Falo que ninguém possui, significante
despótico que anima a luta mais miserável, a ausência
comum a todas as exclusões recíprocas em que os fluxos se exaurem,
ressecados pela má consciência e pelo ressentimento. “Por
exemplo, colocar a mulher num pedestal, ou, ao contrário, torná-
-la indigna de alguma consideração: fazer dela uma dona de casa
modelo, uma mãe ou uma esposa modelo, são simplesmente meios
para nos esquivarmos a qualquer contato com ela. Uma mulher
não figura alguma coisa, ela não é uma personalidade distinta e
definida... Uma mulher é uma estranha e doce vibração do ar, que
avança, inconsciente e ignorada, em busca de uma vibração que
lhe responda. Ou então é uma vibração penosa, discordante e desagradável
ao ouvido, que avança ferindo todos os que se encontram
ao seu alcance. E o mesmo pode ser dito do homem”.
(...)
G. Deleuze e F. Guattari in O anti-édipo
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