10 ANOS DE CAPS: RELATOS DO TEMPO -18
30 de junho de 2014
A questão da identidade do “ser-psiquiatra” infernizava a alma das coisas e a minha própria. Não fazia muito tempo, pessoas importantes (elas se achavam) iam e vinham num círculo de repetição institucional voltado a manutenção de um partido (único) no poder. A estatura ética da psiquiatria manicomial, acadêmica, neurobiológica era repugnante. Eu: ofício de agente duplo se afirmou como estilo técnico. Delirar e deleitar na intimidade das sinapses ajudou o psiquiatra a se manter vivo. As reuniões da equipe técnica (desde sempre na quarta) promoviam o trabalho de fabricação da aparência de um Caps humanístico como todo Caps. Isso fazia parte do funcionamento da forma—Estado. Do fundo da psicopatologia esgotada pelos psicofármacos à mão cheia, erguia-se a clínica dos crônicos, onde e de onde se avistava a foto coagulada dos antigos manicômios. Corria 2014: o país se preparava em direção ao giro do caos enquanto a loucura gerava formas psicóticas e neuróticas afins ao regime das sombras. Tudo em nome da democracia.A política dava sinais de deterioração da subjetividade em prol de um retardo mental do estado. Um coração psiquiátrico tornara-se mente. O que eu quero dizer mesmo é que o país avançava em não avançar. Onde se trabalhava, os transtornos eram cada vez maiores. Tempos obscuros em que a saudade espirraria fluxos de melancolia política tidos como novidade.
A.M.
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