terça-feira, 31 de dezembro de 2019

MARTIN SCORSESE, O CINEMA

Se fosse uma partida de mus, um jogo de cartas bastante popular na Espanha, 2019 obteve quase as mesmas cartas que 2018, mas a cada envido (aposta) do ano passado, o atual lhe respondeu com mais apostas. E se a Netflix tiver problemas? Mais duas. E se os filmes de super-heróis devorarem os outros? Mais sete. E se o Leão de Veneza for polêmico? Mais 17. E se uma obra de alguma plataforma online ganhar o Oscar de melhor filme? Aposta total... as cartas serão reveladas em 9 de fevereiro.

Outro debate significativo, sobre se aquilo que uma plataforma digital produz é cinema, já foi concluído. Independentemente da forma (assim como nas salas de exibição não há apenas cinema, o cinema não é feito apenas para as salas de exibição), o conteúdo triunfa: o importante é a linguagem. Pelo menos é isso que os criadores já entenderam: Martin Scorsese, protagonista por duplo motivo deste 2019, foi produzido pela Netflix, e suas críticas não são por isso, e sim pelo efeito avassalador dos filmes da Marvel ― em geral, de super-heróis ― sobre as demais obras cinematográficas.

No The New York Times, o cineasta afirmou: “Em muitos filmes de franquias trabalham artistas autênticos, pessoas de talento. Sei que, se eu fosse mais jovem, se tivesse amadurecido numa época posterior, possivelmente me apaixonaria por esses filmes e talvez até quisesse fazer um. Mas cresci quando cresci, e desenvolvi um sentido sobre o cinema tão distante do universo Marvel quanto nós, na Terra, estamos de Alpha Centauri [...]. Para mim, para os cineastas que passei a amar e respeitar, o cinema consistia em uma revelação estética, emocional e espiritual. A chave estava aí: era uma forma artística. Nos filmes de Marvel não há revelação, mistério nem autêntico perigo emocional. Não há nenhum risco”. Ele alertou sobre o perigo real: o pouco espaço que o cinema de franquia deixa para os demais filmes nas salas de exibição.
(...)

Gregorio Belinchón, EL País, Madri, 29/12/2019, 16:33 hs

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