quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

Pedimos somente um pouco de ordem para nos proteger do caos. Nada é mais doloroso, mais angustiante do pensamento que escapa a si mesmo, ideias que fogem, que desaparecem apenas esboçadas, já corroídas pelo esquecimento ou precipitadas em outras, que também não dominamos”

– Deleuze & Guattari, O que é a Filosofia?, p. 237


O Caos Caotiza, ele é ao mesmo tempo nosso aliado e nosso inimigo. Partimos ao encontro do Caos, queremos fazer dele um aliado, mas é nosso intento retornar mais forte, sem nos perdermos. Com a Filosofia, fazemos o percurso do Caos ao cais. Essa é nossa forma de dizer que o pensamento navega de modo frágil e ao mesmo tempo audaz num mar de forças, mas quer, hora ou outra, atracar, encontrar pontos de descanso, um pouco de consistência.

Muito cuidado neste momento! Porque para fugir do Caos nos escondemos embaixo de guarda-chuvas de opiniões prontas! Esse não é o caminho seguido por Deleuze e Guattari. Por isso seu horror por discussões (não procuramos uma verdade que passe pelo filtro da dialética), o medo da reflexão (não procuramos por verdades ocultas em nosso Eu Profundo), por isso sua desconfiança pela contemplação (filosofar exige agir).

Queremos rasgar o caos! Inicialmente para mergulharmos nele, mas para posteriormente estender sobre esse rasgo um plano! Isso mesmo, para inserir no Caos nossos próprio movimentos, nossas medidas, nossos critérios. Tudo o que pedimos é um pouco de calma em meio ao caos. Não queremos o apaziguamento das forças, pois sabemos que é delas que tudo é feito e constituído. Mas precisamos, vez ou outra de um passo pra trás, somente assim podemos dar dois passos à frente. Um pouco de Cais em meio ao Caos.

Se falamos de Filosofia, então queremos dizer: “Nos tragam conceitos! É imprescindível que tenhamos conceitos à nossa disposição!”. É isso que pede cada um dos filósofos, de conceitos para estarem à altura do caos. A filosofia enfrenta as meias-filosofias, de bar, de meia tigela, filosofias que prestam-se apenas à discussão, ou almejam o consenso!


O que o filósofo traz do caos são variações que permanecem infinitas, mas tornadas inseparáveis sobre superfícies ou em volumes absolutos, que traçam um plano de imanência secante: não mais associações de ideias distintas, mas re-encadeamentos, por zona de indistinção, num conceito”

– Deleuze & Guattari, O que é a Filosofia?, p. 238


É isso que pedem os cientistas, cada um deles finca o pé em seu plano de referência para dizer: “Este é o estado das coisas, é assim que as vejo da posição que estou”. Os Cientistas criam funções, encontrar variáveis independentes, constantes e limites. Não porque odeiem o Caos, mas sim porque sentem por ele uma profunda atração. É seu prazer olhar para o abismo e ser encarado por ele. A ciência ama o caos e daria toda a sua vontade de unificação em troca de mais um pedacinho de desconhecido para mergulhar e explorar!

Cabe ao cientista, operando uma seleção e uma filtragem, conduzir gradativamente o Caos a centros de equilíbrio. Colocar limites e renunciar às velocidades infinitas. Essa é sua ferramenta, este é seu ofício. Com elas os cientistas combatem as superstições, as falsas proposições, as pseudociências.

O cientista traz do caos variáveis, tornadas independentes por desaceleração, isto é, por eliminação de outras variabilidades quaisquer, suscetíveis de interferir, de modo que as variáveis retidas entram em relações determináveis numa função”


– Deleuze & Guattari, O que é a Filosofia?, p. 238

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Rafael Trindade, do site "Razão inadequada", acessdado em 25/12/2024

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