sábado, 23 de maio de 2015

OS LINGUISTAS SÃO IMPERIALISTAS

(...) Na lingüística, mesmo quando se pretende ater-se ao explícito e nada supor da língua, acaba-se permanecendo no interior das esferas de um discurso que implica ainda modos de agenciamento e tipos de poder sociais particulares. A gramaticalidade de Chomsky, o símbolo categorial S que domina todas as frases, é antes de tudo um marcador de poder antes de ser um marcador sintático: você constituirá frases gramaticalmente corretas, você dividirá cada enunciado em sintagma nominal e sintagma verbal (primeira dicotomia...). Não se criticarão tais modelos lingüísticos por serem demasiado abstratos, mas, ao contrário, por não sê-lo bastante, por não atingir a máquina abstrata que opera a conexão de uma língua com os conteúdos semânticos e pragmáticos de enunciados, com agenciamentos coletivos de enunciação, com toda uma micropolítica do campo social. Um rizoma não cessaria de conectar cadeias semióticas, organizações de poder, ocorrências que remetem às artes, às ciências, às lutas sociais. Uma cadeia semiótica é como um tubérculo que aglomera atos muito diversos, lingüísticos, mas também perceptivos, mímicos, gestuais, cognitivos: não existe língua em si, nem universalidade da linguagem, mas um concurso de dialetos, de patoás, de gírias, de línguas especiais. Não existe locutor-auditor ideal, como também não existe comunidade lingüística homogênea. A língua é, segundo uma fórmula de Weinreich, "uma realidade essencialmente heterogênea". Não existe uma língua-mãe, mas tomada de poder por uma língua dominante dentro de uma multiplicidade política. A língua se estabiliza em torno de uma paróquia, de um bispado, de uma capital. Ela faz bulbo. Ela evolui por hastes e fluxos subterrâneos, ao longo de vales fluviais ou de linhas de estradas de ferro, espalha-se como manchas de óleo. Podem-se sempre efetuar, na língua, decomposições estruturais internas: isto não é fundamentalmente diferente de uma busca das raízes. Há sempre algo de genealógico numa árvore, não é um método popular. Ao contrário, um método de tipo rizoma é obrigado a analisar a linguagem efetuando um descentramento sobre outras dimensões e outros registros. Uma língua não se fecha sobre si mesma senão em uma função de impotência.
(...)
G. Deleuze e F. Guattari in Mil Platôs, vol 1

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