VELOCIDADES
(...)
Em seu rosto e em seus olhos sempre se vê seu segredo. Perca o rosto.
Torne-se capaz de amar sem lembrança, sem fantasia e sem interpretação,
sem fazer o balanço. Que haja apenas fluxos, que ora secam, ora congelam ou
transbordam, ora se conjugam ou se afastam. Um homem e uma mulher são
fluxos. Todos os devires que há no fazer amor, todos os sexos, os n sexos
em um único ou em dois, e que nada têm a ver com a castração. Sobre as
linhas de fuga, só pode haver uma coisa, a experimentação-vida. Nunca se
sabe de antemão, pois já não se tem nem futuro nem passado. "Eu sou assim",
acabou tudo isso. Já não há fantasia, mas apenas programas de vida, sempre
modificados à medida que se fazem, traídos à medida que se aprofundam,
como riachos que desfilam ou canais que se distribuem para que corra um
fluxo. Já não há senão explorações onde se encontra sempre no oeste o que se
pensava estar no leste, órgãos invertidos. Cada linha onde alguém se solta é
uma linha de pudor, por oposição à sacanagem laboriosa, pontual, presa, de
escritores franceses. Já não há o infinito relatório das interpretações sempre
um pouco sujas, mas processos acabados de experimentação, protocolos de
experiência. Kleist e Kafka passavam seu tempo fazendo programas de vida:
os programas não são manifestos, e menos ainda fantasias, mas meios de
orientação para conduzir uma experimentação que ultrapassa nossas capacidades de
prever (do mesmo modo o que chamamos de música programada). A força
dos livros de Castañeda em sua experimentação programada da droga, é que
cada vez as interpretações são desfeitas, e o famoso significante, eliminado.
Não, o cachorro que vi, com o qual corri sob efeito da droga, não é a puta de
minha mãe... É um processo de devir-animal que não quer dizer nada a não
ser o que ele se torna, e me faz me tornar com ele. Outros devires se
encadearão a ele, devires-moleculares (...)
G. Deleuze e C. Parnet in Diálogos
Devires são instantes únicos...Somos fluxos e instantes!!!
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