DESEJO NÃO É NECESSIDADE
(...)
Não é o desejo que se apoia nas necessidades;
ao contrário, são as necessidades que derivam do desejo:
elas são contraproduzidas no real que o desejo produz. A falta é
um contraefeito do desejo, depositada, arrumada, vacuolizada no
real natural e social. O desejo está sempre próximo das condições
de existência objetiva, une-se a elas, segue-as, não lhes sobrevive,
desloca-se com elas, razão pela qual ele é, tão facilmente, desejo
de morrer, ao passo que a necessidade dá a medida do distanciamento
de um sujeito que perdeu o desejo ao perder a síntese passiva
dessas condições. A necessidade como prática do vazio tem
unicamente este sentido: ir procurar, capturar, parasitar as sínteses
passivas ali onde elas se encontram. Não adianta dizer: não somos
ervas, perdemos há muito tempo a síntese clorofílica, é preciso
comer... O desejo torna-se então esse medo abjeto da falta. Mas
não são precisamente os pobres ou os espoliados que dizem
isso. Estes, ao contrário, sabem que estão próximos da erva, e que
o desejo só tem “necessidade” de poucas coisas, não dessas coisas
que lhes são deixadas, mas das próprias coisas que lhes são incessantemente
tiradas, e que não constituem uma falta no coração do
sujeito, mas sobretudo a objetividade do homem, o ser objetivo do
homem para quem desejar é produzir, produzir na realidade.
(...)
G. Deleuze e F.Guattari in O anti-édipo
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