DEVIR-CONSCIÊNCIA
A consciência, mesmo que pareça ser uma luz vinda de dentro do cérebro, ou da mente, é uma tela. É possível dizer a partir de um Bergson deleuziano que a consciência é o contrário da luz. Ela é uma espécie de anteparo para a luz, esta sim, vindo de fora, do cosmo. Para pensar desse modo, há a experiência não usual, não cotidiana, “anormal” do “ser-consciente”. Uma psicopatologia em ato. No encontro com o paciente interessa operar clinicamente uma “outra” consciência. Os casos mais ou menos evidentes de alteração do nível da consciência (os quadros orgânicos) são percebidos como tais à medida em que a anamnese é feita com detalhes. Há uma infinidade deles ligados à condições cerebrais específicas. No entanto, pela via do Encontro não existe a consciência e sim subjetivações ou modos de subjetivação. Um modo de subjetivação é uma composição de afetos. Um traumatismo de crânio, por exemplo, pode gerar uma confusão mental. Mesmo aí, o nível da consciência compõe um modo de subjetivação, e não o contrário. A consciência chega depois. Ela é um efeito proveniente de estímulos que vêm de fora e com o cérebro estabelecem relações de uso. Caso o tecido cerebral esteja danificado (lesionado) os efeitos mudam. O cérebro é matéria, claro, mas o que chega de fora também é matéria. São imagens formando a subjetividade. Assim, o chamado “mundo interior” não existe senão como expressão corporal das imagens. Se estas são matéria, são afetos.O que muda então na avaliação (exame) do paciente portador de transtorno mental? 1-o comportamento observável é sobretudo o afetivo-relacional: como o paciente sente e reage ao mundo? 2-as funções psíquicas não remetem a um centro organizador (a consciência, o eu) como modelo de conduta adequada; 3- a capacidade de autonomia social passa a estar ligada aos devires ou processos desejantes; 4- uma pesquisa destes devires ou: que linhas existenciais o paciente constrói? é essencial, mais até do que obter um diagnóstico nosológico; 5- traçar um plano de vida que comporte os devires como movimentos singulares: o paciente não é o diagnóstico, sequer a doença (caso exista); ele é uma mistura de elementos do real e do não-real; resta usá-la como ato terapêutico.
A.M.
“ A consciência é o contrário da luz; todos os filósofos tem vivido com a idéia de que a consciência era uma luz. Pois não é. O que é luz é a matéria e daí a consciência é o que revela a luz. Por que? Porque a consciência é a tela negra. A consciência é a opacidade, que como tal vai levar a luz a revelar-se, isto é,a refletir-se”, Deleuze, G., Curso de los martes; La imagem movimento, 1982, tradução ao espanhol: Ernesto Hernandez, via Internet, web Deleuze, acessado em 09/12/2003, tradução espanhol-português nossa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário