O QUE DIZER?
Estamos trespassados de palavras inúteis, de uma quantidade demente de falas e imagens. A besteira nunca é muda nem cega. De modo que o problema não é mais fazer com que as pessoas se exprimam, mas arranjar-lhes vacúolos de so1idão e de silêncio a partir dos quais elas teriam, enfim, algo a dizer. As forças repressivas não impedem as pessoas de se exprimir, ao contrário, elas as forçam a se exprimir.Suavidade de não ter nada a dizer, direito de não ter nada a dizer; pois é a condição para que se forme algo raro ou rarefeito, que merecesse um pouco ser dito. Do que se morre atualmente não é de interferências, mas de proposições que não têm o menor interesse. Ora, o que chamamos de sentido de uma proposição é o interesse que ela apresenta, não existe outra definição para o sentido. Ele equivale exatamente à novidade de uma proposição. Podemos escutar as pessoas durante horas: sem interesse ... Por isso é tão difícil discutir, por isso não cabe discutir, nunca. Não se vai dizer a alguém: “o que você diz não tem o menor interesse”. Pode-se dizer: “está errado”. Mas o que alguém diz nunca está errado, não é que esteja errado, é que é bobagem ou não tem importância alguma. É que isso já foi dito mil vezes. As noções de importância, de necessidade, de interesse são mil vezes mais determinantes que a noção de verdade.
(...)
Gilles Deleuze in Conversações
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