MENTIRAS VERDADEIRAS
Em que pese toda a nossa indignação frente aos acontecimentos políticos no Brasil atual, colocamos uma questão para pesquisa: será possível pensar a corrupção sem as habituais categorias morais e/ou psiquiátricas, as quais nos dão suporte para xingamentos e para as execrações do que deve ser de fato xingado e execrado? Filhos-da-puta, canalhas, psicopatas, etc. Sim, sim, concordamos no essencial, desde que coloquemos a dimensão ético-política como motor do funcionamento institucional, onde modos de subjetivação se produzem e se reproduzem. Sendo assim, pensar o objeto (a corrupção) sem as categorias da consciência e do eu torna-se essencial para o nosso método. Há, óbvio, uma extensa lista de subjetivações, sendo indicado (a partir da observação dos discursos do poder) focar a mentira como elemento constitutivo de uma subjetivação parlamentar. Neste sentido, buscaremos deslocar o conceito de mentira para o do ato de mentir. Tal visada teórica "garante" a análise de práticas parlamentares e não a de idéias, desenvolvendo uma pesquisa fina da corrupção como tecido institucional de onde e para onde convergem as falas, inclusive, e principalmente, as mentirosas. Ora, as falas são já práticas em si mesmas, pois nelas estão implícitas palavras de ordem sob o disfarce da informação e da comunicação. O universo parlamentar costuma, então, ser preenchido, recheado por mentiras verdadeiras que são a sua matéria prima, espécie de infra-estrutura das palavras de ordem. Dito de outro modo, o ato de mentir é o combustível desejante para se obter efeitos de poder. Voltaremos a escrever sobre o tema, até porque ele está longe de esgotar sua riqueza...conceitual.
A.M.
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