sexta-feira, 9 de outubro de 2015

NAÇÕES

O que se denomina Estado-nação, sob as formas mais diversas, é precisamente o Estado como modelo de realização. Com efeito, o nascimento das nações implica muitos artifícios: é que elas não se constituem somente numa luta ativa contra os sistemas imperiais ou evoluídos, contra as feudalidades, contra as cidades, mas elas mesmas operam um esmagamento de suas "minorias", ou seja, de fenômenos minoritários ou que se poderia chamar "nacionalitários", que as trabalham de dentro e que quando necessário encontravam um grau de liberdade maior nos antigos códigos. Os constituintes da nação são uma terra, um povo: "natal" que não é forçosamente inato, "popular" que não é forçosamente dado. O problema da nação se exacerba nos dois casos extremos de uma terra sem povo ou de um povo sem terra. Como fazer um povo e uma terra, ou seja, uma nação — um ritornelo? Os meios mais sangrentos e os mais frios concorrem aqui com os arrojos do romantismo. A axiomática é complexa e não lhe faltam paixões. É que o natal ou a terra, como já vimos, implica uma certa desterritorialização dos territórios (lugares comunais, províncias imperiais, domínios senhoriais, etc), e o povo implica uma descodificação da população. É sobre esses fluxos descodificados e desterritorializados que a nação se constitui, e não se separa do Estado moderno que dá uma consistência à terra e ao povo correspondentes. É o fluxo de trabalho nu que faz o povo, como é o fluxo de Capital que faz a terra e seu equipamento. Em suma, a nação é a própria operação de uma subjetivação coletiva, à qual o Estado moderno corresponde como processo de sujeição. É bem sob essa forma de Estado-nação, com todas as diversidades possíveis, que o Estado se torna modelo de realização para a axiomática capitalista, o que de modo algum eqüivale a dizer que as nações sejam aparências ou fenômenos ideológicos; ao contrário, as nações são as formas viventes e passionais onde primeiro se realizam a homogeneidade qualitativa e a concorrência quantitativa do capital abstrato.
(...)
G. Deleuze e F. Guattari in Mil Platôs, vol 5

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