domingo, 3 de abril de 2016

CONTAGEM REGRESSIVA

(...) (...) As pessoas amadureceram para compreender a tática, a necessidade de organizar os passos intermediários para se alcançar um objetivo a mais longo prazo. No momento, o foco é o governo do PT, suas pedaladas fiscais, o rombo na Petrobras, a corrupção que se espraiou, o cinismo e a cara de pau de seus líderes. Um governo de transição só pode ser estável se equacionar bem suas relação com a Lava-Jato. Se escolher nomes de gente sob investigação, vai demonstrar que pensa como o PT e o desalojou do poder apenas para não partilhar com ele as benesses da mamata federal.

Não ter gente investigada é pouco. Será preciso também definir, publicamente, sua norma para o futuro. Aliás, voltar a uma norma do passado, quando existiam ainda vestígios de decência: no governo Itamar, as pessoas investigadas saíam para se defender. Volto para a casa cansado, escrevendo um pouco espremido no avião. O discurso da advogada Janaína Paschoal, uma das autoras do pedido de impeachment, aponta, entre outras, duas realidades interessantes para mim. A primeira delas é a de que há uma conexão entre as pedaladas fiscais, decretos secretos, rombo no orçamento e a corrupção que corroía o país. O dinheiro fantasiado nos planos de Dilma, era, de alguma forma, o dinheiro que se roubava ou, simplesmente, se dilapidava com a incompetência. Um outro ponto que me comoveu foi sua mensagem ao Parlamento: somos apenas parte de um povo que, na realidade, sofreu um golpe, pois analisava a realidade a partir do falso quadro desenhado pelo governo. A missão das ruas é clara: descrever aos parlamentares uma situação em que o povo foi roubado e enganado com fantasias eleitorais. O país sofreu um golpe. Sua única saída é responder ao golpe com uma medida constitucional de autodefesa, que é o impeachment.

Senti que grande parte dos parlamentares compreendeu o cenário. Mesmo os que parecem não ter compreendido, caso de Renan Calheiros, estão apenas fazendo cálculos sobre sua própria salvação. Não creio que exista salvação para figuras como Cunha e Renan. A própria Justiça, cheia de dedos com gente como eles, terá de levar a sério a tese de que a lei vale para todos. Ninguém sai às ruas apenas para trocar de bandidos no poder.

Fernando Gabeira, Segundo Caderno do Globo, 03/04/2016

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