ESQUIZOFRÊNICOS RESIDUAIS
A esquizofrenia existe como processo vital, experiência dilacerante, estilhaçamento do eu, grande dificuldade de expressão, experiência de sofrimento indizível se comparado aos ditos normais, mas ela não existe enquanto entidade clínico-psiquiátrica. Esta foi uma invenção da psiquiatria do século XIX com o objetivo político-institucional e epistemológica de assegurar poder e prestígio à ela própria no âmbito mais geral da medicina de então. A esquizofrenia passou a ser A doença psiquiátrica (loucura como acepção não-médica) garantidora da existência de uma especialidade médica nascente. Ora, em tempos atuais, o rótulo de esquizofrênico passou a ser usado em quase todos os que deliram e/ou alucinam. Há uma generalização semiológica mapeando a detecção de sintomas comportamentais inadequados à ordem vigente, operação que adentra ao coração do desejo e o desfigura, despotencializando-o. Tal grosseria ética e científica encontra respaldo no funcionamento cada vez mais refinado da sociedade industrial de controle, onde a colonização da subjetividade alcança estratos profundos do inconsciente representativo, fazendo da consciência e do eu meros fantoches a serviço das formações de poder. Um largo espectro do horror político é implementado sem cessar, desde as megamáquinas (o Estado )até as pequenas, como o Eu (máquina de angústia), enfim, coordenadores e aliados na administração da servidão moderna. Assim, somos fabricados como esquizofrênicos residuais (ou em vias de sê-lo) encaixados na clínica da incurabilidade psicossocial.
A.M.
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