No diagnóstico psiquiátrico há um problema, menos epistemológico, e mais prático-clínico: o uso: como usá-lo? Para que usá-lo? Por que usá-lo? Em benefício de que ou de quem? Podemos, então, dizer que há dois tipos de diagnósticos: o diagnóstico-essência e o diagnóstico-função. No primeiro, o paciente é identificado a uma suposta essência que o constitui como “ser-doente”. Você é esquizofrênico, você é bipolar, você é histérico, etc. (Repare a incidência do verbo ser). No segundo, há uma preocupação funcional expressa na pergunta: a quem serve tal diagnóstico? Como vai funcionar na proposta terapêutica? De todo modo, em ambos os casos o diagnóstico psiquiátrico inscreve-se numa relação do poder fortemente verticalizada em face dos compromissos político-institucionais da psiquiatria. Não há diagnóstico “inocente”. Todo diagnóstico psiquiátrico tem um fundo moral que lhe garante força para se fazer acreditar, se fazer cumprir, mesmo para o próprio psiquiatra: crer na “sua” ciência. O diagnóstico-essência compõe um credo que, embora não possuindo qualquer respaldo científico (confira a sopa nosológica da CID 10, cap. F) , afirma a psiquiatrização desejada e consentida pela sociedade e suas instituições repressoras da diferença. A prática clínica, como prática de vida, se reveste, então, de grande importância para a construção do pensamento da saúde mental como um sistema conceitual aberto à Arte, à Política, à Literatura, ao Cosmos, às Multiplicidades, enfim.
A.M.
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