sexta-feira, 28 de setembro de 2018

LIVRE DO OUTRO

O sonho de modernidade alimentou nossa autoestima política por quase três décadas. A violência cotidiana recebeu da Constituição de 1988 um lustro democrático, esse verniz de legitimidade que permitiu a rivais políticos, pelo menos, jogar um jogo segundo regras. Só não esperávamos que, ao completar 30 anos, esse projeto fizesse despertar com tanta força um velho adversário: o Movimento Brasil Livre do Outro — MBLO. Rejuvenescido, voltou a proclamar sua estranha ideia de libertação: se não vier por obediência aos libertadores, que venha a fórceps. Com vitória ou derrota eleitoral, o MBLO veio para ficar e barbarizar.

Os libertadores querem nos libertar de quem, afinal? Diante do espelho, há o Brasil que quer ser livre de si mesmo: da corrupção e dos corruptos; dos fatos, da ciência e do valor verdade. E há o Brasil que almeja ser livre do outro: o outro socioeconômico, o outro político e o outro identitário. Melhor dito: livre de mulheres livres, inspiradas pelo feminismo; livre de negros desobedientes, que se fazem de vítimas só porque são mais encarcerados e mortos; livre dos índios indolentes, que ocupam terras de mais e trabalham de menos; livre de sexualidades fora da cartilha, por receio de se identificar com elas; livre da arte degenerada, em nome de um país onde toda nudez será castigada; livre de desajustados e periféricos que pedem um lugar ao centro ou mesmo o fim da periferia.
(...)

Conrado Hubner Mendes, Época, acessado em 28/09/2018



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