MICRO-CONTROLES
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Em quê isso concerne o pensamento de Deleuze (com Guattari)? A questão se coloca tanto mais que Deleuze quase nada conheceu da Internet. Ele não conheceu sua amplitude e nem a maneira pela qual nossos modos de existência são afetados, às vezes abalados pela Internet. As únicas grandes antecipações que Deleuze lança, ao retomar e prolongar Foucault e sobretudo Burroughs, é que nossas sociedades deixaram de ser sociedades disciplinares para se tornarem sociedades de controle. Elas já não funcionam por enclausuramento como as sociedades disciplinares (escola, prisão, caserna), mas por controle contínuo quer dizer, por levantamento de informações) e comunicação instantânea num mundo que se tornou o mundo infinitamente modulável da empresa. O espírito de empresa conquista todas as formações sociais, e as máquinas que lhe correspondem já não são as máquinas energéticas da idade disciplinar e industrial, mas as máquinas cibernéticas da idade empresarial do controle.
Portanto, Deleuze não vê no computador, e nos controles que ele permite estender em proporções inacreditáveis, uma espécie de democratização do conhecimento, nem o feliz retorno ao tranquilo lugar da vila em que todos se reencontram para constituir uma eventual força coletiva de comunicação. Ao contrário, ele vê nisso um forte instrumento de controle, o mais potente que se pode haver hoje. E tem–se também aí um aspecto conhecido que constitui o inverso do que dizíamos há pouco: todo mundo pode saber a todo instante o que faço, qual site consulto, o que compro; pode conhecer meus centros de interesse, meus gostos, minha situação bancária, minha vida conjugal, familiar etc. (Basta ver os sites que favorecem a difusão desse tipo de informações, do tipo Facebook ou Twitter). A hipótese nada tem de paranoica, porque não se trata de vigilância, mas de controle, isto é, de levantamento de informações. Cada um de nós se reduz a um pacote de informações. Pertencer ao seu computador é estar sob controle, não necessariamente policial, mas empresarial, comercial etc., que se exerce sobre as informações que constituem cada modo de existência. E esse controle se exerce ainda mais quando se trata de um computador central, de uma tela de controle (cf. a domótica¹).
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David Lapoujade in Deleuze: política e informação, in Cadernos de Subjetividade, 2010
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