CAPITALISMO E ESQUIZOFRENIA - 3
Sob as condições do capitalismo, a potência dos afetos é reduzida a estágios vizinhos do zero. Basta citar, entre muitos exemplos, os grandes desníveis sócio-econômicos mundiais, a servidão voluntária e a violência naturalizada. Sob as condições da esquizofrenia, a potência dos afetos é reduzida também a estágios vizinhos do zero. Basta verificar os clássicos "estados residuais esquizofrênicos", a apatia profunda. O que o delírio tem a ver com essas "duas" realidades? Vejamos: os afetos (desejos) são o que movem o delírio, e por extensão, a realidade (do capital e da clínica). Se esses afetos estão despotencializados, a realidade, apesar de parecer forte, natural e imutável, também está. É preciso defender os fortes dos fracos, como diria Nietzsche. Expresso concretamente em consumidores apassivados (cidadãos e/ou pacientes), e à serviço das estruturas conservadoras (instituições de toda ordem, o Estado incluído), o delírio e sua produtividade desejante rodopia em torno de si mesmo. O desejo sofre por ser interrompido. Seja na luta política ou na pratica clínica, as rupturas para o Novo só acontecem quando o desejo funciona como processo e não como forma estável (o diagnóstico psiquiátrico?). Desejar é, então, delirar. Tal concepção foge aos dualismos identitários normal/anormal, racional/irracional, subjetivo/objetivo, homem/mulher, etc, em prol de um funcionamento construtivista do desejo. Pois este não é algo natural e sim construído, maquinado, agenciado conforme as circunstâncias das forças em relação. O desejo é processo. Revoluções (de qualquer tipo) são produções desejantes, mesmo que traídas.No campo da psicopatologia clínica, o delírio do paciente (se houver) será avaliado ao início segundo coordenadas ético-políticas, antes que técnicas. Estas são importantes, claro, mas deverão estar à serviço do desejo-produção e não o contrário. Estão aí alguns conceitos básicos para o trabalho de uma psiquiatria materialista, ou seja, a que põe o desejo na produção e a produção no desejo, ao dizer de Deleuze-Guattari nas páginas luminosas do Anti-édipo.
A.M.
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