SER DE ESQUERDA, SER DE DIREITA
Esquerda e Direita não remetem as essências. Elas são (ou deveriam ser) apenas linhas subjetivas usadas para um balizamento político. O que mudar? Por que mudar? Como mudar? Para que mudar? Mudar para quem? São questões amplas para problemas concretos. Todos (não só os políticos) falam em mudanças. Ninguém deixa de falar em mudanças, mormente num país com graves problemas. Seguindo um pensamento das multiplicidades existenciais, é possível falar em muitas esquerdas e em muitas direitas. Tudo vai depender de uma análise das instituições (formas sociais) em jogo num dado momento histórico. Seja um indivíduo: ele pode ter linhas de esquerda e de direita misturadas, entrelaçadas, ao ponto de não ser possível distingui-las. Então, será preciso obter um conceito que abranja um desejo de mudança atravessando modos de subjetivação. Não indagando "quem sou?" (uma identidade) mas: à medida em que o tempo passa, em quem me torno? Ora, se o tempo passa é porque tudo muda, queiramos ou não. Assim, o conceito de "irreversibilidade do tempo" é o que serve para pensar a esquerda e a direita para além das essências ou das formas imutáveis. Não existe essência. O cidadão que acredita encarnar em si mesmo a esquerda ou a direita nutre-se de um imaginário narcísico e paranóico. Somos simultaneamente esquerda e direita postos sob um solo de incessante mudança, ainda que imperceptível. E para lidar com a vertigem do tempo que passa e não volta e com o dualismo grotesco esquerda~direita que busca tamponá-lo, a arte é a linha afirmativa, não a monumental ou a mercantil, mas a arte como estilo ou invenção de vida, de alegria e de possibilidades (infinitas) de criação de um novo mundo. A utopia revolucionária resiste (mesmo encurralada pelo fascismo e seu cortejo mortuário) com toda a potência e necessidade atuais. Ela compõe o desejo e a sociedade como o que há de mais digno para escapar do buraco ético em que a civilização se meteu.
A.M.
Nenhum comentário:
Postar um comentário