TEMPO E CLÍNICA
Em psicopatologia clínica, considerar a relação tempo-subjetividade é essencial. Ela deriva de concepções do tempo implícitas. O tempo é uma categoria teórica que pode ser vista de múltiplas formas. Escolhemos duas por serem referências de destaque:1-como elemento vivencial da chama temporalidade, ao modo da fenomenologia; 2- como conteúdo do processo desejante (devir) segundo a visão de H. Bergson. O que distingue as duas concepções? A fenomenologia, considerando a linha passado-presente-futuro, aloca a subjetividade na consciência-do-tempo, ou seja, no espaço da representação. Isso torna a riqueza da vivência submetida ao "peso" de uma identidade a ser buscada na ordem do eu. O tempo=do-eu é um tempo endurecido no presente que não passa. Isso ocorre, por exemplo, na vivência melancólica. O paciente é espremido no hoje. O passado o acusa, enquanto o futuro o ameaça. Quanto ao tempo do devir, trata-se de outra coisa. Há só o Instante fugidio que é cortado sem cessar em passado/futuro num processo irreversível. Uma vertigem. A consciência, enquanto intencionalidade, é posta como efeito dos devires que lhe atravessam e a constituem. Ela não é lugar de uma verdade a ser descoberta, ou de uma luz, nem mesmo numa origem dos afetos. Estes é que circulam livres em arranjos que se compõem como seta para o futuro, o tempo como criação, invenção de mundos. Pode-se assim dizer que o trabalho do tempo, numa inspiração bergsoniana, vai na trilha de uma subjetividade-em-processo. Não há uma forma subjetiva estabelecida de antemão, mas a se produzir no fluxo e na superfície dos encontros.
A.M.
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