quarta-feira, 29 de março de 2017

O DELÍRIO AJUDA A VIVER

Lembro de um paciente, há alguns anos, me falando que havia uma tesoura enfiada e oculta na sua cabeça. Junto à queixa-crença, ele trazia exames de imagem do cérebro, como RM, TC, US, todos normais. Perguntei-lhe porque ele insistia que a tesoura continuava alojada no cérebro, já que os exames estavam normais. Respondeu-me que os exames é que estavam errados, haviam, sim, falhado já que provavelmente a tesoura estava escondida num locus cerebral de difícil acesso. Apesar de eu saber das limitações clínicas dos neuroexames por imagem na pesquisa da mente, já que o cérebro não é a mente, neste caso o cérebro era o foco material da clínica e a discrepância entre a vivência-convicção do paciente com a imagem projetada sobre o écran era impressionante. Uma tesoura oculta dentro da cabeça não é qualquer coisa. Pois bem: percebi que os argumentos racionais, intelectuais, técnicos, até mesmo argumentos de autoridade ("acredite porque sou médico"), eram completamente inúteis. Eu estava diante de um caso grave de delírio, cuja etiologia (origem) nada tinha a ver com o funcionamento cerebral, já que esse estava absolutamente intacto. Ora, na doença psicossocial petista, em que pese todas as evidências do desmoronamento político-ideológico do petismo atual, a crença- delírio prossegue como mecanismo subjetivo de negação de uma realidade muito dura. E mais, duma realidade esvaziada de sentido conforme os rumos possíveis para uma chamada esquerda que queria e quer mudar o mundo. Desse modo, as pessoas que  acreditavam no sonho petista pós-ditadura de 1964 migraram para o delírio petista dos dias atuais. E sequer desconfiam que estão delirando pois milhões também ainda estão assim. E do mesmo modo que o paciente da tesoura encravada no cérebro, não adianta usar argumentos racionais para convencê-los. Trata-se de um investimento delirante de afetos tristes e mortificantes (depressão) só elimináveis à medida em que a prova de realidade ( o devir da História) o mostrar.  Como o Tempo histórico de uma nação é defasado em relação ao Tempo histórico de uma pessoa, muitos carregarão até a morte o seu "precioso" delírio como algo importante e indispensável (ainda que um fardo) para ajudá-los a viver.

A.M.


P.S. - O texto enfoca o drama dos doentes petistas e não o dos criminosos petistas. Quanto a estes, a Lava-Jato já está tratando...

2 comentários:

  1. Justamente por concordar na totalidade deste seu texto acima, tomando consciência de que talvez ñ exista solução...
    Apesar de ser uma leiga, ñ me considero uma leiga por inteiro pois já passei por crises delirantes ñ somente no coletivo, ñ sendo fácil pra mim expor minhas particularidades...
    Esperando q ñ seja muito tarde registrar a minha preocupação com o drama dos doentes petistas, ñ esquecendo de registrar também aqui a minha preocupação com o drama dos doentes dos outros partidos políticos, doentes esses que se expõem ao máximo até se necessário for se engalfinham, ñ percebendo que são simples marionetes* dos criminosos petistas/antipetistas.
    Penso que se esses doentes levarem o seu "precioso" delírio numa morte natural seria menos trágico do que morrendo com o seu "precioso" delírio em lutas descontroladas entre si...

    *Sem querer diminuir nenhum desses doentes, até pq também já fui e posso mais uma vez ser uma delirante...

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  2. Gostaria se possível compartilhar este texto no facebook
    No aguardo de uma permissão...

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