terça-feira, 21 de março de 2017

ONDE VIVE A DIFERENÇA

A diferença não é um objeto sólido, visível, palpável, identificável em alguém ou em algo à nossa frente.Ela não se presta à relações estabelecidas pelo senso comum, ou mais, ou pior ainda, pelo bom senso das razões intelectuais, mesmo as mais elevadas. Nada mais baixo que ela ao nível da terra, nada mais sutil ela, quase imperceptível. Olhar de lince: a diferença. Ela se dá e se doa apenas a sensibilidades em estado selvagem, a animalidades circulando nos corpos da rua, na luz das veias inundadas por desejos sem órgãos, sem sistemas, sem métodos, sem deuses, sem respostas. A diferença é o bicho. Vive na espreita e da espreita. Surge quando menos se espera e não compactua com percepções grosseiras das formas do mundo adulto e acabado. Por isso e muito mais assusta os idólatras e os escravos das ordens mortuárias quando bem o dia está raiando num cheiro de acácias. A diferença, ela própria, não tem uma identidade, uma definição, nunca ninguém a fotografou. Não é uma imagem, ao contrário, ela é quem faz e tece imagens. Não tem rosto pois é ela quem o fabrica. Ele se torna, então, alegria aos montes vivendo no equilíbrio precário das linhas da arte. Inventa algo, alguma coisa pequena, ínfima, pura criação no e do tempo, ou o próprio tempo em "estado puro", a diferença, uma criança.

A.M. 

2 comentários:

  1. Infelizmente Manoel de Barros esqueceu/ñ teve tempo de fotografá-la, haha

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  2. Falha minha!
    Manoel de Barros fotografou n vezes a diferença, haha

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