68 PASSOU
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P. Em resumo, seu filme é uma crítica aos que aqui em Paris, no Brasil ou em qualquer lugar tentam viver de uma visão que você considera não realista de 1968.
R. Eu acho que a história anda, a fila anda. A nostalgia mata. Por que buscar em maio de 1968 as energias? Tem tanta coisa importante acontecendo hoje em dia, tantas lutas importantes. Por que buscar exemplos de um tempo que foi deslumbrante? A sociedade era diferente, a sociedade. O (um dos principais líderes de Maio de 1968, Daniel) Conh-Bendit diz isso muito bem e é considerado um canalha por muita gente. O Conh-Bendit diz que 68 acabou, e isso não quer dizer que não teve importância capital. Assim como a Revolução Francesa foi uma revolução capital, mas ninguém sai na rua pensando em Robespierre. Sai pensando nas questões contemporâneas. Tem um apego desmesurado com algo que começou tantos anos atrás que impede, às vezes, de: número 1, enfrentar fatos da história; e, número 2, perceber que há de novo forças neste momento que exigem outro tipo de enfrentamento, outro tipo de luta. O apego é conservador, como todo o apego ao passado é conservador. Vou repetir isso quantas vezes me perguntarem: isso não é sinônimo de que não acho que, naquele momento, aquela luta foi deslumbrante, generosa, libertária, mudou a sociedade, mas passou. 68 não está vivo. Negar a história é o primeiro caminho para a ilusão.
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Flávia Marreiro, El País, Paris, entrevista com João Moreira Sales, 02/04/2017, 12:29 hs
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