"O que faz uma pessoa começar a atirar dentro de uma igreja, um lugar para se estar em paz?", se perguntava Caroline Mott, de 28 anos, diante de uma das portas, ainda com vestígios de sangue, da Catedral de Campinas, palco do ataque de um atirador que deixou quatro mortos e quatro feridos na tarde desta terça-feira –um deles em estado grave. O rastro de morte e pavor havia sido deixado horas antes por Euler Grandolpho. O homem de 49 anos, um recluso morador do município vizinho de Valinhos, deixou sua casa por volta do meio dia. Percorreu os 11 km que separam a cidade de Campinas de ônibus, carregando uma mochila com duas armas e quatro cartuchos de munição. Estava decidido a destroçar a vida de vários fiéis e o fez. O que a polícia ainda não sabe é o porquê.
A missa das 12h15 já tinha terminado. Grandolpho estava pacientemente sentado em um dos largos bancos da catedral do século XIX. Então levantou-se e começou os disparos. Cerca de 20 pessoas ainda faziam suas orações no momento que o ataque começou. "Percebi que no meio da igreja um rapaz se posicionou de frente a um casal e começou a atirar à queima-roupa. A minha reação, assim como a de vários que estavam lá dentro foi sair correndo. Tudo foi muito rápido", diz o aposentado Pedro Rodrigues, de 66 anos.
Durante a ação, o atirador recarregou uma vez a pistola, cujo pente tinha capacidade para 11 balas. Em seguida, disparou mais dez vezes e se suicidou, com a última bala, numa tragédia em parte capturada pela câmera do circuito interno da catedral, instalada num ângulo alto da nave central, a contraluz. Grandolpho só parou de atirar quando policiais, PMs e da Guarda Municipal que estavam nas redondezas, escutaram os disparos e entraram na catedral para confrontá-lo. O atirador acabou sendo ferido na lateral do corpo, na altura do abdômen, e depois resolveu atirar contra a própria cabeça, caindo próximo ao altar. “Sem a intervenção da polícia, a matança seria maior”, disse o delegado.
Um Brasil em choque tomou ciência de um inusual tipo de barbárie irracional até mesmo para um país que possui um catálogo longo de barbáries. Enquanto o ataque ganhava o noticiário e corria ainda mais rápido com fotos e primeiras impressões no WhatsApp, tomava forma também a inevitável discussão sobre a natureza do tiroteio e o papel das armas nele, o que deve seguir nos próximos dias. A tragédia ocorre em meio ao debate sobre a ampliação do porte da posse de armas no território brasileiro, uma forte bandeira do presidente eleito Jair Bolsonaro. Na igreja, a polícia encontrou duas armas – uma pistola 9 mm e um revólver 38 –, ambas como a numeração raspada, um indício de que podem ter sido adquiridas ilegalmente. Com mais armas na mão se aumenta a possibilidade de um rompante louco como esse?
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Heloisa Mendonça, El País, Campinas, 12/12/2018, 02:18 hs
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