quinta-feira, 12 de novembro de 2015

PRODUÇÃO DO RANCOR

Vivemos em um mundo desagradável, onde não apenas as pessoas, mas os poderes estabelecidos têm interesse em nos comunicar afetos tristes. A tristeza, os afetos tristes são todos aqueles que diminuem nossa potência de agir. Os poderes estabelecidos têm necessidade de nossas tristezas para fazer de nós escravos. O tirano, o padre, os pastores, os gurus, os tomadores de almas, têm necessidade de nos persuadir que a vida é dura e pesada. Os poderes têm menos necessidade de nos reprimir do que de nos angustiar, ou, como diz Virilio, de administrar e organizar nossos pequenos terrores íntimos. A longa lamentação universal sobre  a vida: a falta-de´ser que é a vida... Por mais que se diga "dancemos", não se fica alegre. Por mais que se diga "que infelicidade a morte", teria sido preciso viver para ter alguma coisa a perder. Os doentes, tanto da alma quanto do corpo, não nos largarão, vampiros, enquanto não nos tiverem comunicado sua neurose e sua angústia, sua castração bem amada, o ressentimento contra a vida, o imundo contágio.
(...)
G. Deleuze e C. Parnet in Diálogos

2 comentários:

  1. "O homem do ressentimento possui uma prodigiosa memória - ele atribui aos outros a causa de seus sofrimentos. Sua memória está a serviço desta atribuição de culpas, do ódio à vida. Esta memória é fruto de um rigoroso e cruel adestramento corporal. Um grande estômago que nunca consegue digerir o que tem dentro de si, ultrapassar, esquecer os sofrimentos de que foi vítima, desistir do que lhe falta, reconstruir o que foi destruído. Mas esta culpa que ele atribui aos outros breve se transformará em culpa de si próprio - a culpa é interiorizada e generalizada. Neste segundo estágio da produção do ressentimento, a má consciência, é ele próprio o culpado pelos seus sofrimentos e pelos dos outros. Acima de tudo ele não pode viver o novo sem transformá-lo em velho. Ele contamina o novo com o velho: estando prevenido contra os sofrimentos futuros, mata o momento presente em seu nascedouro"

    Cristina Rauter, in Clínica do Esquecimento.

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    1. O ressentimento tem muitas máscaras, muitas figuras, nem sempre perceptíveis. O ressentimento não é um atributo psicológico e sim da Cultura que se traduz, e se expressa em subjetividades oprimidas e opressoras.

      A.M.

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