DO PURO DEVIR
Alice assim como Do outro lado do espelho tratam
de uma categoria de coisas muito especiais: os acontecimentos,
os acontecimentos puros. Quando digo "Alice cresce",
quero dizer que ela se torna maior do que era. Mas
por isso mesmo ela tambem se torna menor do que é agora.
Sem dúvida, não é ao mesmo tempo que ela é maior e
menor. Mas é ao mesmo tempo que ela se torna um e outro.
Ela é maior agora e era menor antes. Mas é ao mesmo
tempo, no mesmo lance, que nos tornamos maiores do que éramos e que nos fazemos menores do que nos tornamos.
Tal é a simultaneidade de um devir cuja propriedade é furtar-se
ao presente. Na medida em que se furta ao presente,
o devir não suporta a separação nem a distinção do antes
e do depois, do passado e do futuro. Pertence a essência
do devir avançar, puxar nos dois sentidos ao mesmo tempo:
Alice não cresce sem ficar menor e inversamente. O bom senso é a afirmação de que, em todas as coisas, há um
sentido determinável; mas o paradoxo é a afirmação dos dois
sentidos ao mesmo tempo.
(...)
G. Deleuze in Lógica do Sentido
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