domingo, 15 de abril de 2018

A CENA MENTAL

Os psicofármacos compõem hoje a rostidade psiquiátrica. Usamos "rostidade" num sentido deleuziano-guattariano, ou seja, como um regime de traços da aparência que compõe a cena clínica da psiquiatria. De um lado, o psiquiatria, pronto para sacar o seu remédio, do outro o paciente à espera da salvação química, ou pelo menos da melhora dos seus males (sintomas) imediatos ou não. A configuração prática dessa situação faz da psicopatologia clínica um meio instituído onde o método científico cede espaço aos dispositivos de controle do comportamento social.Mas não só do paciente, aquele que supostamente sofre e precisa do cuidado, mas também do psiquiatra, enredado nos códigos médicos de atendimento a um organismo físico-químico avariado. Tal enquadre bilateral (o paciente e o médico compondo um meio de comunicação) objetiva realçar o modus operandi da psiquiatria na produção de uma subjetividade fechada em si mesma. No entanto, há uma questão conceitual: "subjetividade " aqui não está centrada numa pessoa, não é uma pessoa, mas tudo que se passa entre o médico e o paciente e é exportado para outras relações, no caso, as relações de todos (incluindo os demais técnicos em saúde) com o chamado portador de transtorno mental. Daí, levando ao máximo as consequências de tal perspectiva, o psiquiatra e os que cuidam do paciente, estão, tal como nas doenças infecciosas, contaminados pela patologia. Doentes, pois.

A.M.

Nenhum comentário:

Postar um comentário