FAZER UM CORPO
De todo modo você tem um (ou vários), não porque ele pré-exista ou
seja dado inteiramente feito — se bem que sob certos aspectos ele pré-
exista — mas de todo modo você faz um, não pode desejar sem fazê-lo — e
ele espera por você, é um exercício, uma experimentação inevitável, já feita
no momento em que você a empreende, não ainda efetuada se você não a
começou. Não é tranqüilizador, porque você pode falhar. Ou às vezes pode
ser aterrorizante, conduzi-lo à morte. Ele é não-desejo, mas também desejo.
Não é uma noção, um conceito, mas antes uma prática, um conjunto de práticas. Ao Corpo sem Órgãos não se chega, não se pode chegar, nunca se
acaba de chegar a ele, é um limite. Diz-se: que é isto — o CsO — mas já se
está sobre ele — arrastando-se como um verme, tateando como um cego ou
correndo como um louco, viajante do deserto e nômade da estepe. É sobre
ele que dormimos, velamos, que lutamos, lutamos e somos vencidos, que
procuramos nosso lugar, que descobrimos nossas felicidades inauditas e
nossas quedas fabulosas, que penetramos e somos penetrados, que amamos.
No dia 28 de novembro de 1947, Artaud declara guerra aos órgãos: Para
acabar com o juízo de Deus, "porque atem-me se quiserem, mas nada há de
mais inútil do que um órgão". É uma experimentação não somente
radiofônica, mas biológica, política, atraindo sobre si censura e repressão.
Corpus e Socius, política e experimentação. Não deixarão você
experimentar em seu canto.
(...)
G. Deleuze e F. Guattari in Mil platôs
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