O MUNDO DEPRIMIDO
A depressão não é uma doença, pelo menos não no modelo biomédico. Isso não significa dizer que não haja o sofrimento depressivo, antes, pelo contrário. São afetos destrutivos, matizados por vivências devastadoras para a sobrevivência subjetiva, mesmo que o organismo por vezes esteja hígido, intacto. Ora, se a depressão não é primariamente uma doença no sentido médico, ela é sim um estado psíquico desprazeroso, variável em sua gravidade, segundo os fatores que lhe são determinantes. Há uma variação infinda. Queremos pontuar apenas o aspecto de que a depressão, codificada pela mídia inculta como "o mal do século", tem a sua gênese estritamente ligada à condição humana, no que ela implica de perdas sucessivas, mortes simbólicas ou reais, e acima de tudo, o estilhaçamento aparentemente sem volta dos valores da sociedade industrial burguesa. Tais valores não são externos à subjetividade, ao contrário. Eles são linhas que balisam as certezas de quem somos, ou seja, são crenças. Em que ou quem acreditar em tempos de niilismo? Talvez estas crenças não mais nos sirvam, pelo menos para uma vida alegre e potente. Ficou ou fica um grande buraco existencial, a depressão in vivo, sofrendo na pele, no corpo, no olhar, no rosto, nos corpos doloridos e mortificados, a brutalidade insana dos tempos modernos.
A.M.
Nenhum comentário:
Postar um comentário