ROSTO INUMANO
(...) O rosto é inumano no
homem, desde o início; ele é por natureza close, com suas superfícies
brancas inanimadas, seus buracos negros brilhantes, seu vazio e seu tédio.
Rosto-bunker. A tal ponto que, se o homem tem um destino, esse será mais
o de escapar ao rosto, desfazer o rosto e as rostificações, tornar-se
imperceptível, tornar-se clandestino, não por um retorno à animalidade,
nem mesmo pelos retornos à cabeça, mas por devires-animais muito
espirituais e muito especiais, por estranhos devires que certamente
ultrapassarão o muro e sairão dos buracos negros, que farão com que os
próprios traços de rostidade se subtraiam enfim à organização do rosto, não
se deixem mais subsumir pelo rosto, sardas que escoam no horizonte,
cabelos levados pelo vento, olhos que atravessamos ao invés de nos vermos
neles, ou ao invés de olhá-los no morno face a face das subjetividades
significantes. "Eu não olho mais nos olhos da mulher que tenho em meus
braços, mas os atravesso nadando, cabeça, braços e pernas por inteiro, e
vejo que por detrás das órbitas desses olhos se estende um mundo
inexplorado, mundo de coisas futuras, e desse mundo toda lógica está
ausente. (...) Quebrei o muro (...), meus olhos não me servem para nada,
pois só me remetem à imagem do conhecido. Meu corpo inteiro deve se
tornar raio perpétuo de luz, movendo-se a uma velocidade sempre maior,
sem descanso, sem volta, sem fraqueza. (...) Selo então meus ouvidos, meus
olhos, meus lábios". CsO * Sim, o rosto tem um grande porvir, com a
condição de ser destruído, desfeito. A caminho do assignificante, do
assubjetivo. Mas ainda não explicamos nada do que sentimos.
(...)
Gilles Deleuze e Félix Guattari in Mil Platôs, vol.4
* Corpo sem òrgãos
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