terça-feira, 7 de agosto de 2018

Clínica dos afetos - III

Em psicopatologia a clínica dos afetos está voltada à expressão dos afetos do paciente, mas também do técnico que o atende. Apesar disso, no caso psiquiátrico, pelo menos na versão atual positivista, biológica, a mente, decalcada do cérebro, é examinada como um objeto inerte, reificado. Ou seja, tornado coisa. Desse modo, o psiquiatra é afetado, sim, mas tão só como um cientista dotado de visão asséptica e neutra. Os afetos desse cientista serão avaliados conforme a observação da conduta alterada do suposto doente. A figura tradicional do psicótico ilustra bem tal campo imaginário, remetendo a prática à hipótese etiológica de disfunção e/ou lesão cerebral. Ora, sob tais condições, o médico está desimplicado com a realidade subjetiva do outro, bem como produz uma demanda infinita de remédios químicos. Trata-se da opção primeira para organismos lesionados. Nada mais distante de um prática clínica dos afetos. Não que estes sejam implicitamente bons (o humanismo em torno da chamada pessoa não é o nosso caso...) mas sim energéticas corporais, vibrações, estremecimentos, intensidades, potências que fabricam o sentido e o valor de viver. Isso abrange tanto o paciente quanto quem o atende. A experiência da loucura, com tudo que encerra de desestruturante, bizarro, misterioso e surpreendente, fica longe da pesquisa clínica nos termos da psiquiatria oficial. 


A.M.

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