quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

O AVESSO DO AVESSO

Em Hollywood, o movimento Time’s Up, apoiado por mais de 300 atrizes, conseguiu tingir de preto a cerimônia do Globo de Ouro, em protesto contra as agressões sexuais. Na França, um grupo formado por uma centena de artistas e intelectuais tomou nesta terça-feira a direção contrária ao assinar um manifesto criticando o clima de “puritanismo” sexual que o caso Harvey Weinstein teria desencadeado. O texto, publicado no jornal Le Monde, é assinado por conhecidas personalidades da cultura francesa, como a atriz Catherine Deneuve, a escritora Catherine Millet, a cantora Ingrid Caven, a editora Joëlle Losfeld, a cineasta Brigitte Sy, a artista Gloria Friedmann e a ilustradora Stéphanie Blake.

“O estupro é um crime. Mas a sedução insistente ou desajeitada não é um crime nem o galanteio uma agressão machista”, afirmam as autoras deste manifesto. “Desde o caso Weinstein houve uma tomada de consciência sobre a violência sexual exercida contra as mulheres, especialmente no âmbito profissional, onde certos homens abusam de seu poder. Isso foi necessário. Mas esta liberação da palavra se transforma no contrário: nos intima a falar como se deve e nos calar no que incomode, e os que se recusam a cumprir tais ordens são vistos como traidores e cúmplices”, argumentam as signatárias, que lamentam que as mulheres tenham sido convertidas em “pobres indefesas sob o controle de demônios falocratas”.

Entre as promotoras do manifesto estão personalidades que já haviam expressado opinião oposta a esse movimento, quando não abertamente contrárias a certas lutas do feminismo. Por exemplo, a filósofa Peggy Sastre, autora de um ensaio intitulado A Dominação Masculina Não Existe, ou a escritora Abnousse Shalmani, que em setembro assinou um artigo onde descrevia o feminismo como um novo totalitarismo. “O feminismo se transformou em um stalinismo com todo seu arsenal: acusação, ostracismo, condenação”, disse na revista Marianne. Por sua vez, a jornalista Élisabeth Lévy qualificou como “abjeto” o movimento iniciado com rótulos como #MeToo ou #balancetonporc (“denuncia teu porco”). Em um tom mais moderado, Deneuve também se opôs a este fenômeno no final de outubro. “Não acho que seja a forma mais adequada de mudar as coisas. O que virá depois? Denuncia tua puta? São termos muito exagerados. E, sobretudo, acho que não resolvem o problema”, declarou na época. Também Millet, crítica de arte e autora do relato autobiográfico A Vida Sexual de Catherine M., se opôs repetidamente a um feminismo “exacerbado e agressivo”.
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Álex Vicente, El País, Paris, 09/01/2018, 18:37 hs

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