sábado, 30 de junho de 2018

RESPONSABILIDADE INVERTIDA

O Brasil vive um momento particularmente instrutivo. Sem rodeios ou meias palavras, parece ter chegado o tempo de se pôr as cartas na mesa: a fatura da inconsequência das elites políticas e econômicas será, uma vez mais, quitada pelo povo. A inversão do ônus da responsabilidade de ações que resultaram na degradação das instituições no país está em curso.

Impulsionada por essa tendência, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou a PL 580/2015, que altera a lei de execução penal para que os/as encarcerados/as passem a ressarcir o Estado pela sua manutenção no sistema prisional. Na justificativa da proposta, sinaliza-se que a transferência dos custos do cárcere para os/as presos/as abre espaço para o investimento em outras áreas estratégicas. Nas declarações de muitos senadores/as, está a preocupação de se evitar que o erário seja onerado com a manutenção das “mordomias” patentes nos presídios brasileiros.

Essa pauta está alinhada à uma agenda governamental que trabalha por meio de ações truculentas. Não nos deixa mentir a intervenção militar deflagrada no Rio de Janeiro em fevereiro desse ano. O desfile de tanques de guerra; a humilhação das revistas e o toque de recolher impostos às periferias negras da cidade foram as cenas televisionadas para se sinalizar a firmeza do golpe. Os resultados mais palpáveis desse espetáculo bélico são as pilhas de corpos desumanamente descartados, como no caso que deixou a Maré de luto pelo assassinato de Marcus Vinicius da Silva no último dia 20. Com o slogan do controle e do extermínio, cobra-se o pedágio de quem mais sofreu com as artilharias pesadas da alardeada corrupção.
(...)

Ana Flauzina, El País, 29/06/2018, 15:03 hs

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