terça-feira, 2 de abril de 2019

TRECHO DE "O LIVRO INVISÍVEL"  DE WILLIAM BURROUGHS 

A consciência é continuamente cortada por fatores fortuitos. 
Tento tornar isto explícito cortando palavras. Esta é a minha 
teoria sobre arte. A arte está alertando o homem sobre si 
mesmo, ressaltando os fatos atuais da percepção. 
BURROUGHS 1 Mas diga-me, meu caro Burroughs, acaso a 
capacidade de ver o que temos à frente é uma forma  de 
escapar da imagem-prisão que nos rodeia? 
BURROUGHS 2 Decididamente, sim. Porém muito pouca gente 
tem esta capacidade, e cada vez serão menos, conforme 
passe o tempo. 
BURROUGHS 1 Por que? 
BURROUGHS 2 Por uma razão: a absoluta barreira de imagens 
a que estamos submetidos acabará  por nos embotar a todos. 
Recorde, em comparação, que há cem anos havia poucas 
imagens. As pessoas viviam em um cenário mais simples, em 
um meio ambiente camponês, tropeçavam em poucas 
imagens, e essas poucas eram vistas com bastante clareza. 
Porém se alguém é bombardeado, sem descanso, com a 
propaganda inscrita nos caminhões ou táxis que passam… 
BURROUGHS 1 …com as imagens da televisão e dos jornais… 
BURROUGHS 2 …sim, com as imagens da televisão e dos 
jornais, esse alguém acaba embotado. Forma-se uma névoa 
permanente diante dos olhos e já não se vê nada. 
BURROUGHS 1 E o que se deveria ver? 
BURROUGHS 2 Que não há nada interposto entre uma pessoa 
e a imagem. Um granjeiro vê suas vacas de verdade: vê o que 
tem diante de si e o vê bem claro. Não é um problema de 
hábito: o problema é que algo se coloque entre alguém e a 
imagem, de tal forma que o impeça de vê-la. Não quero dizer 
que o granjeiro tenha nenhum tipo de identificação mística 
com a vaca, mas sim que sabe quando a vaca não está bem. 
Ele sabe tudo o que se refere à vaca, a forma com que a vaca 
lhe é útil e como se encaixa em seu meio ambiente. 
(...)

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