Política
Em uma sociedade como a nossa, conhecem-se, seguramente, os procedimentos de exclusão. O mais evidente, o mais familiar, é a interdição.Sabe-se bem que não se tem o direito de tudo dizer, que não se pode falar tudo em nenhuma circunstância, quem quer que seja, enfim, não pode falar de qualquer coisa. Tabu do objeto, ritual da circunstância, direito privilegiado ou exclusivo do sujeito que fala: tem-se o jogo de três tipos de interdições que se cruzam, se reforçam ou se compensam, formando uma malha complexa que não cessa de se modificar. Eu observaria somente que, hoje, as regiões onde a malha é mais estreita, onde as casas escuras se multiplicam, são as regiões da sexualidade e da política: como se o discurso, longe de ser esse elemento transparente ou neutro em que a sexualidade se desarma e a política se pacifica, fosse um desses lugares onde elas exercem, de maneira privilegiada, algumas das suas mais temíveis potências. O discurso, ainda que aparentemente não seja muito, as interdições que o atingem, revelam logo, e rapidamente, seu vínculo ao desejo e ao poder.E isso não surpreende: pois o discurso - a psicanálise já nos mostrou - não é simplesmente o que manifesta (ou esconde) o desejo; é também o objeto do desejo; e porque - isso, a história não cessa de nos ensinar - o discurso não é simplesmente o que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas o pelo que e o para que se luta, o poder que se busca conquistar (...)
Michel Foucault- A Ordem do discurso - da aula inaugural no Collège de France - 2/12/1970 - tradução de Antonio Carlos Cerezzo
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