A SOLUÇÃO QUE NÃO SOLUCIONA
Desde a redemocratização, crises de insegurança pública se repetem no estado do Rio de Janeiro. Houve a crise de 1994, com a taxa de homicídios recorde. Em 2000, houve o recorde de sequestros. Em 2007, houve o recorde de mortes em confrontos com a polícia.
Em anos recentes, a experiência de policiamento em proximidade – simbolizada nas UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) – trouxe um alívio parcial para as mazelas do estado. A taxa de homicídios chegou a 25 por grupo de 100 mil habitantes, a menor da história. A comunidade Santa Marta, erguida nas encostas do Morro Dona Marta e sede da primeira UPP, ficou por sete anos sem homicídios e tiroteios. A elite do asfalto passou a frequentar festas nos morros.
A paz temporária foi rompida com a falência financeira e administrativa do estado. Depois dos Jogos Olímpicos de 2016, os recursos federais secaram. A taxa de letalidade violenta veio aumentando seguidamente, o roubo de carga explodiu e os incessantes tiroteios nas comunidades voltaram a fazer parte do cotidiano.
A quadrilha política incrustada no estado foi desmontada, mas os bilhões de recursos desviados se mostraram chagas numa estrutura já doente. A crise econômica, somada ao naufrágio das lideranças políticas no mar da corrupção, foi elemento importante na eclosão da atual onda de violência.
A resposta mais frequente e pedida para as crises de insegurança tem sido chamar as Forças Armadas. O argumento mais comum é apontar como ilógica a não mobilização de um contingente militar de quase 300 mil homens – sendo 190 mil só do Exército –, já que o país não tem um inimigo externo a enfrentar. Usando esses militares no combate ao tráfico e na ação ostensiva de patrulhamento, haveria melhora na sensação de segurança, alegam os defensores da mudança constitucional do papel das tropas.
As forças armadas não são treinadas para prender. São treinadas para matar
Diversos especialistas, no entanto, concluíram que ações tópicas dos militares podem reduzir crimes em um primeiro momento, mas, em longo prazo, a atividade criminosa adapta-se e permanece.
Por dois anos as Forças Armadas patrulharam pontos com presença forte de facções criminosas em comunidades do Rio. Elas estavam lá antes da chegada das Forças, continuaram intocadas apesar da presença delas e restabeleceram seus domínios quando os militares deixaram essas comunidades.
Os exemplos mais conhecidos de participação das Forças Armadas na segurança pública são os do México e da Colômbia, países responsáveis pela distribuição e produção de grande parte da droga que circula no continente. Não podem ser tomados como um modelo, pois enfrentam hoje disputas internas de poder que os ameaçam com a classificação de narco-Estados, de tal monta é o enfronhamento das organizações criminosas em suas instituições políticas, administrativas e econômicas.
Um experiente general coloca o ponto principal nas operações das Forças Armadas: as tropas são treinadas para aniquilar inimigos, não para conter, vigiar e prender.
A intervenção federal na segurança pública é uma resposta a um quadro agudo de incompetência e desmazelo. A opção militar, no entanto, tem tudo para mostrar-se inútil, arriscada ou com efeitos danosos a longo prazo.
Época, 17/02/2018, 21:53 hs
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