NÃO HÁ MAIS FORA
A passagem da sociedade disciplinar à sociedade de controle se caracteriza, inicialmente, pelo desmoronamento dos muros que definiam as instituições. Haverá, portanto, cada vez menos distinções entre o dentro e o fora. Trata-se, efetivamente, de um elemento de mudança geral na maneira pela qual o poder marca o espaço, na passagem da modernidade à pós-modernidade. A soberania moderna sempre foi concebida em termos de território – real ou imaginário – e da relação desse território com seu fora. É assim que os primeiros teóricos modernos da sociedade, de Hobbes a Rousseau, compreendiam a ordem civil como um espaço limitado e interior que se opõe à ordem exterior da natureza, ou que dela se distingue. O espaço circunscrito da ordem civil, seu lugar, se define por sua separação dos espaços exteriores da natureza. De modo análogo, os teóricos da psicologia moderna compreenderam as pulsões, as paixões, os instintos e o inconsciente metaforicamente, em termos espaciais, como um fora no âmbito do espírito humano, como um prolongamento da natureza bem no fundo de nós. A soberania do indivíduo repousa, aqui, em uma relação dialética entre a ordem natural das pulsões e a ordem civil da razão ou da consciência. Por fim, os diversos discursos da antroposofia moderna sobre as sociedades primitivas funcionam, freqüentemente, como o fora que define as fronteiras do mundo civil. O processo de modernização repousa nesses diferentes contextos, na interiorização do fora da civilização da natureza.
No mundo pós-moderno, entretanto, essa dialética entre dentro e fora, entre ordem civil e ordem natural chegou ao fim.
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Michael Hardt
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