sábado, 10 de novembro de 2018

QUAL A POSIÇÃO DE MORO?

Os caminhos de Sergio Moro e Hamilton Mourão se cruzaram notadamente em 2 de outubro do ano passado, quando o juiz teceu comentários sobre a ditadura apenas dezessete dias depois de o general ter previsto a intervenção militar como "iminente".

Na ocasião, Moro afirmou que as Forças Armadas tinham sido importantes para a formação e a história do país, mas que a ditadura militar iniciada em 1964 tinha sido "um grande erro". Num evento em que recebia homenagem, o magistrado ainda disse que a única saída para os males democráticos, como a corrupção, era o "aprofundamento da democracia".

Podem não ser frases de um Churchill, mas, neste governo de clara fixação em soluções verde-oliva, trata-se de uma enorme vantagem ter um "superministro" comprometido com as liberdades civis garantidas pela Constituição. Talvez seja o único lado bom na entrada dele no ministério de Jair Bolsonaro. No mais, a leitura indiscutível do momento é negativa para a Lava-Jato: o presidente eleito nomeia como ministro o juiz que prendeu (e que posteriormente manteve preso) seu maior rival, Lula, como noticiou o Times londrino.

A tentação é chamar Moro de cabo eleitoral de Bolsonaro, quando o mais provável é que Moro tenha sido a onda a ser surfada. No momento em que foi eleito super-herói dos descontentes com o PT, magnetizou toda a casta de políticos que ainda restava de pé. Álvaro Dias, do Podemos, tinha lançado a ideia de Moro como ministro da Justiça. Mourão admitiu que o convite ao juiz, por parte do PSL, foi feito durante a campanha eleitoral. Se o magistrado tivesse se filiado a um partido e se candidatado, talvez estivéssemos falando de um outro sucessor de Temer.

A presença de Moro no gabinete de Bolsonaro, porém, representa um desafio para ambos. Se Moro realmente defender "o respeito aos direitos e à Constituição", como diz em sua nota, será um freio para boa parte dos projetos controversos do presidente eleito. Poderá ser um tremendo embaraço às ambições de Bolsonaro na primeira resposta que der sobre a excludente de ilicitude – aquela carta branca para policiais matarem bandidos, sem serem julgados – , ou mesmo sobre o abominável projeto da Escola Sem Partido, que cria espaços hipervigiados nas salas de aula, impermeáveis ao debate, repletos de paranoia e francamente contrários à livre expressão.

Diante dessas perguntas com claro risco de atrito, Moro vai ter que se posicionar. Saberemos em breve se como jurista ou como soldado.
(...)

Márvio dos Anjos, Época, Nov/2018



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