EXPERIMENTAÇÃO DE SI MESMO
(...) Mas o que é, precisamente, um
encontro com alguém que se ama? Será um encontro com alguém, ou com
animais que vêm povoá-los, ou com ideias que os invadem, com movimentos
que os comovem, sons que os atravessam? E como separar tais coisas? Posso
falar de Foucault, contar que ele me disse isso e aquilo, detalhar como o vejo.
Não é nada enquanto eu não souber encontrar realmente esse conjunto de
sons martelados, de gestos decisivos, de idéias em madeira seca e fogo, de
atenção extrema e de fechamento súbito, de risos e sorrisos que sentimos
serem "perigosos" no mesmo momento em que se sente a ternura – esse
conjunto como única combinação cujo nome próprio seria Foucault. Um
homem sem referências, diz François Ewald: o mais belo cumprimento...
Jean-Pierre, o único amigo que nunca deixei e que não me deixou... E Jerôme,
essa silhueta móvel, em movimento, por todo lado penetrado de vida, e cuja
generosidade, amor, se alimenta em um lar secreto, JONAS... Em cada um de
nós há como que uma ascese, em parte dirigida contra nós mesmos. Nós
somos desertos, mas povoados de tribos, de faunas e floras. Passamos nosso
tempo a arrumar essas tribos, a dispô-las de outro modo, a eliminar algumas
delas, a fazer prosperar outras. E todos esses povoados, todas essas
multidões não impedem o deserto, que é nossa própria ascese; ao contrário,
elas o habitam, passam por ele, sobre ele. Em Guattari sempre houve uma
espécie de rodeio selvagem, em parte contra ele próprio. O deserto, a
experimentação sobre si mesmo é nossa única identidade, nossa única chance
para todas as combinações que nos habitam. Então nos dizem: vocês não são
mestres, mas são ainda mais sufocantes. Queríamos tanto uma coisa tão
diferente.
(...)
G. Deleuze e Claire Parnet, in Diálogos
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