AS DEPRESSÕES: duas falas
Paciente 1- 19, homem, classe média alta, estudante de engenharia civil; havia tentado suicídio uma vez; tentou cortar o pulso; foi atendido em emergência e se salvou; perguntado sobre a tentativa, respondeu não ver sentido em nada no mundo atual; na presença da genitora, esta comentou: " meu filho, você não é uma pessoa triste; até que é um rapaz alegre", ao que respondeu: "sim, eu sou alegre, o mundo é que é triste".
Paciente 2- 45, mulher, com queixa de de "sempre fui pra baixo, meio deprimida; chorava muito"; classe média, emprego com boa remuneração, situação econômica estável, casada (classifica como "bom" casamento ), relaciona-se muito bem com duas filhas de um casamento anterior, goza boa saúde física; em geral tem uma "vida boa e arrumada" ; na segunda entrevista, disse: " tá tudo bem, tá tudo certo com o mundo; o problema sou eu; tem alguma coisa errada comigo".
Comentário: no primeiro caso, o paciente acusa o mundo; no segundo, a paciente acusa a si mesma; clinicamente poder-se-ia dizer que o diagnóstico é o de uma depressão? Mas, afinal, o problema é o mundo ou o sujeito? Claro que temos poucos dados anamnésticos para uma discussão; no entanto, queremos tão apenas pontuar o nexo irrecusável das depressões com o Mundo, ou , no que dá no mesmo, com a Ordem Socio-Cultural. Que se argumente: todas as patologias "mentais" tem esse nexo, claro. Ora, o caso das depressões se destaca por dois aspectos, no mínimo:1-há um claro aumento da sua morbidade nos tempos atuais; 2-a vivência depressiva incorpora a um só tempo, dados bioquímicos, psicológicos, sociais, culturais, econômicos, religiosos, metafísicos, entre outros... toda uma multiplicidade girando em torno da pergunta: a vida merece ser vivida? Este me parece o móvel para uma ampla pesquisa (não atrelada a um bioquimismo tosco) que pode esclarecer alguns enigmas do deprimido na contemporaneidade.
Antonio Moura
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