segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

MISTURAR OS CÓDIGOS

Escutar  um delírio:  som musical que  pode  ser  terrível,  ou não.   Música embriaga   até    corações  enrijecidos. Não  busque fórmulas, protocolos, cifras. Saia  de  si. Pense  contra  si.  A forma-psiquiatria não tem dono. Ela  é   dona de  nós  cegos  no momento de desembrulhar  um caso  difícil.  Tratar  além   do feijão  com arroz, tão  fácil, ainda  mais  se   o feijão com arroz  for  fabricado  em série. Instituir   a contra-instituição sem binarismos  não é  fácil, sabemos.  Chegar ao não-lugar da  traição incessante.  A coisa toda vem do  século  XIX.  É  uma  fraude cuidadosamente preparada  em  pequenos  frascos. Todos acreditam. Um dia, ele  entra  no consultório  e  senta-se  na cadeira  do paciente. Não  se trata  de uma “inversão de papéis” ao  jeito  do psicodrama. Isso seria  impossível e por  demais  humanístico. Trata-se da   desordem  infiltrada no  tecido   da    ordem asséptica. O psiquiatra é o paciente que  resiste ao funcionamento linear da  entrevista. Pergunta  se  há  consciência. Não  há. Descobre  que o cérebro  é uma instituição instituída desde a forma de falar sozinho. Ensaia  solilóquios  fugidios. A essa  altura, se  rompem  identidades. Escutar  o delírio é olhar as vozes e  ouvir o tempo  que  não passa... e já passou. Trair é  inventar (...)

Antonio Moura

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