ELE PRECISA DE UM PSIQUIATRA - II
Para pensar a questão da involuntariedade em psiquiatria, há dois níveis conceituais a considerar. Um, o da especialidade médica, imediatamente visível. O outro, o da instituição, encoberto pelo primeiro, mas não menos importante. Tal disjunção teórica advém da própria epistemologia psiquiátrica, a qual concebe o "transtorno mental" como seu objeto de pesquisa. Ora, se há transtorno da mente, pressupõe-se o que quer dizer mente. É desagradável ter que dizer o óbvio, mas a mente não é o cérebro. A mente é um construto social, não sendo um objeto natural, e é por isso que a psiquiatria, antes de ser uma especialidade médica, é uma instituição. Isso confere o primado da pesquisa em psicopatologia à realidade social. Não se trata de ideologia, mas de uma posição metodológica dirigida ao real concreto das relações sociais. Como foi dito, o paciente não se sente um doente da psiquiatria, já que ele está antes doente da sociedade da e na qual a psiquiatria surgiu. Na clínica, ao psiquiatra é atribuída a função social de controle dos transtornos. Diferentemente das demais especialidades médicas, a psiquiatria engendrou-se historicamente como percepção moral das condutas inadequadas. Ela primeiro julga e depois trata. Assim, o juízo psiquiátrico, que não é só psiquiátrico, pois é compartilhado por todos os que trabalham em saúde mental, promove o rechaço do paciente a quem dele se aproxima.
A.M.
Nenhum comentário:
Postar um comentário