sexta-feira, 30 de março de 2018


UM MUNDO QUE NOS EXCLUI

Que esconde a mentira dos signos amorosos? Todos os sig­nos mentirosos emitidos por uma mulher amada convergem para um mesmo mundo secreto: o mundo de Gomorra, que também não depende desta ou daquela mulher (embora deter­minada mulher possa encarná-lo melhor do que outra), mas é a possibilidade feminina por excelência, como um a priori que o ciúme descobre. O mundo expresso pela mulher amada é sem­pre um mundo que nos exclui, mesmo quando ela nos dá mos­tras de preferência. Mas, de todos os mundos, qual o mais exclusivo? "Era uma terra incógnita terrível a que eu acabava de aterrar, uma fase nova de sofrimentos insuspeitados que se abria. E, no entanto, esse dilúvio da realidade que nos submer­ge, se é enorme a par de nossas tímidas e ínfimas suposições, era por elas pressentido (...) o rival não era semelhante a mim, suas armas eram diferentes, eu não podia lutar no mesmo terreno, proporcionar a Albertina os mesmos prazeres, nem mesmo con­cebê-los de modo exato." Nós interpretamos todos os signos da mulher amada, mas no final dessa dolorosa decifração nos de­paramos com o signo de Gomorra como a expressão mais pro­funda de uma realidade feminina original.
(...)
G. Deleuze in Proust e os signos

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